quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

O “esqueleto de concreto” mais antigo da cidade fica no centro e o seu endereço é a histórica Rua do Carmo


Quando das minhas reportagens aéreas onde o assunto era o trânsito na Radial Leste sentido centro e elevado, dava e ainda dá para ver um prédio abandonado semiacabado no centro em meio a outros arranha-céus.

No dia-a-dia das coberturas nunca tive tempo para abordar o assunto, mas agora buscando referências a históricas aos esqueletos de concreto que avistei em meus 21 anos de sobrevoos, lembrei desse edifício localizado na pacata Rua do Carmo.

Nessa rua hoje se localiza o ponto de entrada ao Poupatempo Sé também, um endereço também cheio de histórias e tradições.

Até metade da década 1970 ali funcionou o Diário Popular, um dos mais tradicionais jornais paulistanos, fundado em 1884 e extinto no ano de 2001.

Em frente ao prédio do jornal funcionava o Colégio do Carmo, localizado onde hoje está a entrada do Poupatempo Sé.

Restam de outros tempos nessa rua os antigos sobrados e a igreja Nossa Senhora da Boa Morte que apesar do nome, era conhecida como a "igreja das boas notícias", porque de sua torre se avistava toda a várzea do Tamanduateí. 

De lá era possível saber com antecedência quem se aproximava da cidade proveniente de Santos, como foi o caso de Dom Pedro I após proclamar a independência, no Ipiranga, em 7 de setembro de 1822.

Também na Rua do Carmo, há um prédio cuja construção foi abandonada décadas atrás, ou seja, bem antes do início dos nossos sobrevoos que começaram em 1989.

Durante a obra da construção inacabada algumas paredes chegaram a ser fechadas com tijolos e outras partes permaneceram abertas à espera de uma conclusão.

De tão antiga, surgiu na construção inacabada uma vegetação nativa
Nunca houve uma explicação oficial sobre o motivo da interrupção da obra e nem porque o terreno nunca mais foi ocupado por outra edificação.

O que se sabe é que o prédio foi projetado para ter 23 andares e servir de edifício-garagem para a então crescente frota de automóveis.

Anúncios chegaram a ser publicados nos jornais da época, mas depois os trabalhos foram paralisados.

Na parte de cima do anúncio, a propaganda de venda das garagens do prédio inacabado

Pelo que se entende pela leitura da propaganda veiculada na Folha de S. Paulo, em 5 de março de 1964, a intenção era vender as garagens por unidade. Um negócio desse tipo acontecia também na Rua Jaguaribe.

Assim como se vendem apartamentos para moradia, o proprietário de um automóvel poderia comprar a sua garagem pagando por ela 50.000 cruzeiros e estacionar seu carro com comodidade para ir ao trabalho.

Ocorre que a garagem serviria apenas para guardar o carro e depois não havendo também o apartamento de moradia como ocorre nos empreendimentos atuais.

Com essas informações já dá para entender porque o negócio não seguiu adiante. Faltaram interessados.

A ideia de se construir um estacionamento no subsolo dos edifícios residenciais pelo visto ainda não existia.

Até hoje a maioria dos prédios do antigo centro não possui garagem e isso ajuda a explicar um pouco da decadência nessa região da cidade.

Mas a ideia de se guardar os automóveis em um prédio exclusivo para isso deu certo em outros lugares.

Como exemplo cito um edifício ainda em funcionamento na Avenida Senador Queiroz.

O edifício garagem da Avenida Senador Queiroz funciona no sistema de estacionamento com estadias mensais ou avulsas
Um outro prédio do gênero, levado adiante na Avenida 23 de Maio, não teve a mesma sorte e segue abandonado e lacrado.

Sua marquise serve de cobertura para o sono de alguns moradores de rua do sofrido centro da capital paulista.

Voltando ao prédio da Rua do Carmo, número 93, este é apenas um entre os 708 edifícios não utilizados ou em abandono na cidade de São Paulo.

Este dado foi passado pela prefeitura paulistana após o incêndio que levou ao desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, próximo ao Largo do Paissandú, em 1° de maio de 2018.

A Secretaria Municipal de Urbanismo e Licenciamento informou na época que os proprietários desses 708 condomínios estavam sendo notificados no sentido de dar uma função social às suas propriedades como estabelece a Constituição Federal.

De lá para cá, ao que parece, nada mudou.

A quantidade de prédios abandonados e ocupados movimentos de luta por moradia segue muito grande.

São cerca de 70 imóveis nessa situação apenas no centro da cidade, segundo informações obtidas pelos repórteres na época do desabamento do prédio que serviu de sede à Polícia Federal.

Essa infelizmente é uma das marcas negativas de São Paulo aos olhos do País e do mundo.

Nessa foto da Rua do Carmo do início dos anos 70  se percebe que tudo mudou, menos a fachada do prédio abandonado

Fontes: BBC News e Portal São Paulo Antiga

7 comentários:

  1. Ótima materia. Infelizmente centro de SP tem estes problemas sérios. Pra piorar agora cresce a cada dia número de usuários de drogas e moradores em situação de rua ali na região da Sé, fazem suas necessidades nas ruas, roubam pedestres e nada é feito para resolver isso...

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  2. Novamente bem interessante conhecer os bastidores da história. Pena que essa construção não deu certo, como você disse, outras deram super certo, nos mesmos moldes e prosperaram. Grata por compartilhar.

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Show de texto. Muuita informação. Parabens. Marcão

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  5. Muito boa a matéria!
    Na rua Barão de Iguape,quase defronte à entrada do Pronto Socorro do Hospital Bandeirantes,há um prédio que também está há décadas somente no esqueleto,salvo engano creio que é mais antigo que o da rua do Carmo.

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  6. Excelente matéria, Geraldo.

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