sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Você já se imaginou dentro de um helicóptero no meio de um nevoeiro? Isto faz parte da rotina de um repórter aéreo

Boa parte dos motoristas, vez por outra, enfrenta neblina pelo caminho, especialmente nas estradas.

Imagine agora ter que encarar a neblina voando em um helicóptero? Precisei enfrentar essa situação inúmeras vezes nos meus tempos de repórter aéreo.

 

São Paulo é uma cidade onde o clima se modifica rapidamente. Às 7 da manhã vem a neblina, depois às 10 horas aparece um sol radiante.

 

No Sistema Anchieta - Imigrantes, costumeiramente acontecem nevoeiros. Sol na cidade e depois tempo fechado na serra e interligação.

Em várias ocasiões com o helicóptero na hora da decolagem avistei céu claro e visibilidade satisfatória. Depois, de repente, tudo fecha.

Tem hora que o piloto acaba ingressando no meio das nuvens e nós ficamos preocupados, mas eles não se perdem, se orientam pela bússola ou na conversa com outros pilotos pela fonia.

Quando era preciso voar em dias de nevoeiros esparsos, voltava minha concentração ainda mais para o trânsito. Olhava para baixo e deixava que o piloto, escolhesse os caminhos.

 

 

Mas houve uma vez em que o nevoeiro nos abraçou por completo. Perdemos a visibilidade totalmente. Não se enxergava um palmo à nossa frente, nem para baixo e nem para os lados.

O comandante que estava comigo começou subir na vertical para ganhar altura e sair acima do nevoeiro.

Subiu, subiu até que o sol apareceu sobre um céu azul lindíssimo. A cidade lá embaixo seguia coberta pela neblina e nós ficamos voando acima das nuvens.

 

 

De acordo com a meteorologista Joselia Pegorin, da Climatempo, que durante anos prestou serviço para a Rádio Eldorado, nevoeiro e neblina são essencialmente a mesma coisa.

“O termo difere a visibilidade, na neblina se consegue ver além de um quilômetro, no nevoeiro a distância pode se tornar bem menor”.

Para quem viaja de avião não há nenhum empecilho nessas condições, porque eles são pressurizados e conseguem voar bem acima das nuvens.

Além do que, se houver nevoeiro na hora do pouso, a descida acontece com a ajuda de instrumentos.

O Aeroporto de Congonhas utiliza o sistema ILS I (Instrument Landing System), que permite ao comandante a aproximação exata da pista mesmo que só se consiga enxergá-la nos momentos finais antes de tocar o solo.

Em Guarulhos onde os nevoeiros costumam ser mais frequentes, pela proximidade da Serra da Cantareira, a aproximação é feita em ILS CAT III Alpha, considerado o sistema de pouso mais seguro e avançado do mundo.

Os nossos helicópteros nem dispunham desses equipamentos até porque nossa finalidade era outra, observar o trânsito e nada mais além disso. 

 

 

Repórter aéreo voa sempre com o rádio ligado e fica escutando a emissora onde trabalha para, na hora que for chamado, entrar no ar com o relato do que está vendo lá entre os automóveis.

Aquela vez, cercado por completo pela neblina e depois sem ter como ver o que acontecia lá embaixo, fui obrigado a improvisar, informando aquilo que tinha visto antes de tudo fechar.

 

 

Naquele dia em que passamos a voar acima das nuvens a única coisa que deu para ver foi a ponta das torres transmissoras de televisão localizadas na Avenida Paulista.


 

O tempo de voo ia passando e diante daquela situação comecei a ficar preocupado com a possibilidade do combustível acabar sem que o nevoeiro se dissipasse.

Ficava eu olhando para o ponteiro do combustível e o piloto não me dizia nada. De repente surgiu uma abertura entre as nuvens e foi possível ver abaixo de nós o prédio do Estadão, na Marginal do Tietê.

 

 


Ufa! Foi como estar perdido e de repente encontrar o caminho de casa.  

O comandante baixou a altura, ingressou na brecha surgida e pudemos seguir para o Campo de Marte sãos e salvos.

Depois, na emissora, contei ao pessoal o que havia acontecido.

Ouvi da locutora Rose de Oliveira, o seguinte comentário:

“Vou colocar um apelido em você, de agora em diante vou te chamar de Geraldo Nuvens”.

sábado, 5 de dezembro de 2020

Complexo Esportivo do Ibirapuera está a venda. Quem quer comprar?

“Ibirapuera Complex, a maior e mais moderna arena multiuso da América Latina.”

A frase, que é quase um slogan, dá início ao vídeo postado no You Tube pelo governo paulista, para "vender", o Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães no Ibirapuera.

Inaugurado em 25 de janeiro de 1957, o conjunto reúne em um mesmo terreno, o Estádio Ícaro de Castro Melo, o Conjunto de Piscinas Caio Pompeu de Toledo e o Ginásio de Esportes Geraldo José Almeida.

O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) anunciou, em sua última reunião, que não existe nada naquele complexo esportivo que mereça ser preservado.

Tal decisão abriu a oportunidade para quem adquirir o terreno de promover alterações naquilo que lá existe.

Consta do projeto a construção de um hotel cinco estrelas com heliponto e até de um shopping center.

A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou o projeto, na terça-feira, 1° de dezembro de 2020, que autoriza a concessão para a iniciativa privada por um prazo de 35 anos, com investimento mínimo de R$ 220 milhões.

O assunto ainda irá passar pela Câmara Municipal de São Paulo, porque o terreno foi doado pela prefeitura, em 1954.

Entidades em defesa do esporte olímpico se mostraram contrárias à proposta, assim como um grupo de urbanistas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo – FAU/USP.

Alegam que a privatização poderá interferir na preparação de novos atletas, além de afastar o público que recebe atividades recreativas gratuitamente. 

Haverá impactos no trânsito, porque a construção de um shopping center modifica tudo o que está à sua volta.


Em outras épocas a administração pública investia na elaboração de projetos de fundo social ligados ao esporte.

A queda nesses investimentos, certamente, está ligada à diminuição na quantidade de cursos e eventos, antes ali realizados.

Além das competições esportivas, inúmeros espetáculos culturais e artísticos aconteciam no Ginásio do Ibirapuera. 

Muita gente ainda se lembra dos shows de patinação do "Holliday On Ice", das apresentações de Roberto Carlos e das bandas de rock no Ginásio do Ibirapuera, como Genesis, Jethro Tull e Deep Purple, entre outras.

Em 1998, no Estádio Ícaro de Castro Melo, os Rolling Stones fizeram uma exibição memorável ao lado de Bob Dylan.

 Na atualidade outras arenas estão recebendo esses grandes shows e, mais recentemente, - por causa da pandemia - torneios esportivos foram suspensos ou disputados sem a presença do público.

Quando não entra dinheiro, também os governantes perdem o interesse, entendem eles que não há como destinar dotação orçamentária para bancar atividades que dão prejuízo e o fator social acaba esquecido.


Sobre os cursos mantidos gratuitamente nas dependências do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, temos uma história para contar.

Em décadas passadas, nos matriculamos em um curso de natação para pessoas com deficiência.

Uma das piscinas do Ibirapuera foi adaptada para essas aulas que proporcionaram recreação através do esporte a muitos deficientes físicos.

O curso possibilitou a todos nós, a oportunidade de aprender a nadar, fortalecendo nossa capacidade aeróbica e a autoestima em todos.


Formamos até um time de polo aquático e, por tudo isso, quem participou daquelas atividades jamais se esquecerá, tamanha a felicidade proporcionada.

Experiências deste tipo servem agora de exemplo para mostrar que o esporte aproxima as pessoas independente da raça, cor, religião ou gênero.

Para aquele curso foi designada uma professora especialista no ensino da natação para pessoas com mobilidade reduzida.

Junto com ela trabalhavam assistentes, estagiários em educação física e até uma equipe que nos ajudava a entrar e a sair da piscina.

No grupo havia cadeirantes e os que se locomovem com a ajuda de órteses, próteses, muletas ou mesmo bengalas.

Tais equipamentos não podem entrar na água então, o auxílio de alguém na entrada e na saída da piscina, se torna um fator essencial.

Na ocasião foi criado um vestiário adaptado às nossas condições e tudo funcionava sem nenhum luxo, tudo simples e funcional.

Mesmo com poucas verbas havia criatividade em tudo aquilo que se fazia.


O curso transcorreu normalmente até que um novo governo, que não é o atual, modificou a diretoria do Complexo Constâncio Vaz Guimarães.

Com uma nova filosofia de trabalho que buscava mostrar austeridade com o dinheiro público, nossa professora especialista não teve seu contrato renovado, o mesmo acontecendo com a equipe de apoio.

Todas ocupavam cargos comissionados e, na burocracia da máquina pública, o contrato a título precário pode ser extinto em qualquer momento.

Para a sorte daquele grupo o curso prosseguiu porque havia entre os funcionários públicos concursados uma professora treinada pela antecessora.

Essa profissional deu conta do recado, assumiu muito bem o comando das aulas, mesmo sem a equipe de apoio que não foi reposta.

Todos os paraplégicos ficaram na dependência da boa vontade de outros funcionários que, quando chamados, deixavam por alguns minutos suas atividades para nos ajudar a entrar e sair da piscina.

As aulas prosseguiram mais algum tempo até surgir um novo problema. A piscina aquecida passou a esfriar por causa de um vazamento.

Fomos informados que aulas seriam suspensas para a reforma, mas para isso seria necessária a abertura de uma licitação pública.

A licitação incluiu a piscina olímpica, a céu aberto, que precisava também de reparos urgentes.


A foto aérea acima mostra a piscina olímpica completamente vazia, sinal da demora em se aprovar as reformas tão necessárias. 

Devido à longa espera o grupo de alunos paraplégicos se dispersou e aquele curso de natação acabou sendo extinto.


A foto da carteirinha prova nossa frequência como aluno do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães.

Sempre e em todo lugar, cabe ao Estado, o papel de abrir portas para o desenvolvimento pessoal e social de cada cidadão ou cidadã.

Para isso existem as escolas públicas e outros mecanismos como é o caso do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, criado para atender qualquer cidadão que queira se desenvolver nas práticas esportivas.

Deixar de destinar verbas para o funcionamento de órgãos tão importantes, é simplesmente lamentável.

A população agora ficará na dependência daqueles que adquirirem o complexo desportivo podendo fazer dele aquilo que quiserem. 

Constâncio Ricardo Vaz Guimarães, nasceu na cidade de Santos, em 1915, e se tornou atleta do clube Saldanha da Gama. 

Ao término da carreira esportiva se dedicou à pesquisa e desenvolvimento do esporte em todo o Brasil.

A notícia de seu falecimento em São Paulo, em abril de 1961, repercutiu no país todo e o governo paulista de então, em justa homenagem, deu seu nome ao maior conjunto poliesportivo construído no Ibirapuera.

Um santuário esportivo dessa proporção e grandeza mereceria um olhar mais afetuoso de nossas autoridades e da sociedade que no fundo parece concordar com decisões que prejudicam sempre o lado mais fraco.

Assista à campanha iniciada pelo governo João Doria para “vender” o Ibirapuera. Confira o vídeo abaixo ou acesse:

https://www.youtube.com/watch?v=pfE6tkOg038&feature=emb_logo

 

 


 

quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Júlio Abe e seu Museu de Rua na defesa da memória afetiva

 Fotógrafo, arquiteto, historiador e museólogo, o professor Júlio Abe Wakahara criou o Museu de Rua com o objetivo de despertar na população o sentido de se preservar o patrimônio histórico através da memória afetiva.

                    

A memória afetiva está no sentimento de cada um ao recordar lugares e acontecimentos que fizeram parte de sua trajetória de vida.

O projeto durou décadas. Montado em seu escritório, cada edição do Museu de Rua seguia com autorização da prefeitura, para os bairros sendo instalada em lugares públicos de grande movimento.

Fotos com legendas explicativas em cartazes impermeáveis, permaneciam semanas ou até meses em um mesmo lugar, para mostrar aos passantes um pouco da história de cada localidade.

Depois, a exposição seguia para um outro ponto da mesma região e lá ficava por mais algum tempo. 

Museus de Rua foram criados e expostos em vários bairros como Freguesia do Ó, Bexiga, Butantã, Pompeia, Pinheiros e até mesmo o Centro da cidade.



Júlio Abe fugia das entrevistas. “Nem é preciso citar o meu nome, o importante é motivar as pessoas a conhecerem a história dos lugares onde elas vivem”, dizia.

Em 2002 recebemos dele o convite para uma exposição conjunta de fotografias no Citibank Hall, da Avenida Paulista.

A mostra São Paulo de Todos os Tempos, foi organizada por Júlio Abe, em homenagem ao nosso programa de rádio.

Na ocasião colocamos as fotos ampliadas de nosso livro que levava o mesmo título e foi um grande sucesso.

         

Algum tempo depois dessa mostra, Júlio Abe foi atropelado quando atravessava a Rua Frei Caneca, em frente ao seu ateliê. Socorrido a tempo sobreviveu, mas ficou semanas em coma.

Recuperado voltou a trabalhar e deslocou suas atividades para o Grande ABC onde desenvolveu estudos sobre outra de suas paixões, o distrito ferroviário de  Paranapiacaba, no município de Santo André.


                                                                                   

O jornalista Ademir Medici em sua coluna Memória, no Diário do Grande ABC da terça-feira, 24 de novembro de 2020, destacou as atividades de Júlio Abe entre os moradores da vila ferroviária.

“Foi montada uma exposição sobre a trilha do Peabiru, o caminho de ligação aberto pelos indígenas, desde o oceano Pacífico até o Atlântico”.

Medici explicou em seu texto que, em 2019, Júlio Abe fez uma palestra em Paranapiacaba ressaltando a importância do nevoeiro local, "como fator de preservação do meio ambiente e defendeu seu tombamento como patrimônio natural e/ou paisagístico".

             

No mesmo dia Júlio Abe avaliou que não haverá dinheiro que consiga restaurar o sistema funicular de trens. “As pontes de ferro teriam que ser substituídas, não tem jeito de recuperar, já os túneis estão perfeitos, o que é incrível”.

                     

Funicular é o nome dado ao sistema de trens desenvolvido pelos ingleses no século 19 para a subida da Serra do Mar.

Vagões eram içados em cabos de aço, puxados pelas rodas de uma locomotiva fixa, uma tecnologia muito avançada para a época.


    

Júlio Abe Wakahara graduou-se em arquitetura e urbanismo pela FAU-USP, turma de 1968.

Fez mestrado pela mesma instituição onde foi professor de comunicação visual e museologia.

Presidiu o Conselho Regional de Museologia, quarta região do Estado de São Paulo e foi diretor da Divisão de Museus da Prefeitura de São Paulo e do Centro Cultural São Paulo.

    

Júlio se despediu de nós na madrugada do sábado, 21 de novembro de 2020, aos 79 anos, vítima da Covid-19.





sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Tebas, arquiteto e escravo ganha escultura na Praça Clóvis no Dia da Consciência Negra

 A notícia da homenagem prestada a Tebas, o arquiteto negro que viveu entre os séculos 18 e 19 e levou as águas do Anhangabaú até um bebedouro público da Rua Direita, despertou alegria nos estudiosos de nossa história, em especial, dos que preservam e cultivam a memória paulistana.

Não foram poucas as vezes em que nos referimos a Tebas, cujo nome de batismo era Joaquim Pinto de Oliveira, no programa São Paulo de Todos os Tempos pela Rádio Eldorado.

Foi ele também o responsável pela conclusão da reforma da velha Igreja da Sé, demolida para dar lugar à atual Catedral Metropolitana.


Foto aérea mostra a junção entre a Praça da Sé e a Clóvis onde foi colocada a escultura do mestre Tebas


Autodidata, talhava pedras para serem usadas nas construções e desse trabalho prestado ao seu proprietário que era mestre de obras, vieram depois as criações consideradas geniais para aquela época.



           Desenho mostra o bebedouro criado por Tebas, na confluência da Sé com a Rua Direita


Coube ao arquiteto negro, a responsabilidade de ornamentar a antiga igreja do Mosteiro de São Bento, depois demolida em 1911, para dar lugar à edificação agora existente.


      Antigo cartão postal mostra a igreja velha do Mosteiro de São Bento que Tebas ornamentou


Outra construção importante com sua participação foi da igreja da Ordem Terceira do Carmo, localizada bem no início da Avenida Rangel Pestana, conforme ilustração abaixo.


       Esta é a Igreja da Ordem Terceira do Carmo em seu formato original onde Tebas trabalhou


Em nossos programas na Rádio Eldorado entrevistamos, certa vez, o senhor Abelias Rodrigues da Silva, que trabalhou na cidade como motorneiro, ou seja, conduzia bondes.

Ao se aposentar, dedicou-se aos assuntos que diziam respeito a Tebas, personagem ao qual desejava dedicar um livro.

O antigo motorneiro morreu sem realizar este sonho, mas o arquiteto escravo do século 19 foi reconhecido, embora tardiamente.


  A velha Igreja da Sé não ficava onde se encontra a catedral e sim na entrada da Rua Boa Vista


Tebas morreu em 1811, e só bem depois no século 21, é que o Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo – Sasp, o reconheceu como profissional do setor, no ano de 2018.

E o sonho do senhor Abelias se concretizou por completo, graças ao livro “Tebas: Um Negro Arquiteto na São Paulo Escravocrata”, lançado em 2019 pelo jornalista Abílio Ferreira.

No texto é explicado que o proprietário de Tebas, era Bento de Oliveira Lima, mestre de obras contratado para reformar a então igreja da Sé, morto antes da conclusão, tendo Tebas comandado os trabalhos até o final.

Endividada, a família do proprietário vendeu Tebas para a Igreja, tendo ele obtido sua alforria aos 58 anos. Depois, seguiu trabalhando como arquiteto até o fim da vida.


   A obra de arte e seu autor, o artista plástico Lumumba Afroindígena


A escultura dedicada a Joaquim Pinto de Oliveira, o Tebas, foi instalada entre a Sé e a antiga Praça Clóvis. Sua inauguração aconteceu nesta sexta-feira, 20 de novembro de 2020, Dia da Consciência Negra.

Feita em inox, ferro e com base de concreto, possui 3,60 metros de altura e foi desenvolvida por Lumumba Afroindígena, em parceria com a arquiteta Francine Moreira.

A obra custou R$171 mil à Secretaria Municipal de Cultura que promoveu, após a inauguração, projeções na Igreja do Carmo e um bate papo com os criadores, mais o jornalista Abílio Ferreira.


  Nos detalhes finais, antes da inauguração, os autores foram fotografados ainda atrás dos tapumes





  Ilustração imaginária apresenta o arquiteto Tebas em seu trabalho habitual na São Paulo antiga

 

segunda-feira, 9 de novembro de 2020

11/11: Saiba detalhes do dia em que cai com o helicóptero da Rádio Eldorado na Marginal do Pinheiros

 Assisti certo dia na televisão uma reportagem explicando por que os numerólogos consideram 11 de novembro, uma data emblemática. 

A junção duas vezes do número 11, ou seja, 11/11, leva as pessoas neste dia a se tornarem mais solidárias em relação ao próximo.

A força do número 11 decorre, na verdade, da liderança exercida pelo número 1, o que vem sempre primeiro. 

Os nascidos em um dia 1°, segundo os numerólogos, possuem a capacidade, se necessário, de exercer liderança em todas as atividades que praticarem.

Este repórter nasceu em um dia 1° e passou por uma situação dramática, em 11/11/2005, quando o helicóptero em que estava despencou do céu em meio ao trânsito na Marginal do Rio Pinheiros.

Foi um pouso forçado em auto rotação, que é quando o motor apaga, mas as hélices continuaram girando e através delas se faz a descida. 

Se trata de uma manobra arriscada, que só se faz em emergências. Graças a Deus saímos ilesos. 

O  objetivo daquele voo era levar aos ouvintes da Rádio Eldorado orientações sobre o trânsito. 

Naquele dia, porém, fomos os causadores do congestionamento em uma das vias mais movimentadas da cidade de São Paulo.

Ao descer, nossa aeronave esbarrou em dois carros. Já no chão deslizou sobre o asfalto, se desmanchando em pedaços até parar debaixo da Ponte Eusébio Matoso.

O pequeno modelo Robinson R-22 Beta teve as hélices superiores e o rotor de cauda destruídos, mas a cabine onde estavam piloto e repórter permaneceu intacta.

Era uma sexta-feira, 8h30 da manhã. No impacto, o tanque de combustível rachou e a gasolina se esparramou sobre a pista. 

Todos ao redor, pessoas que estavam dentro de seus automóveis,  presenciaram a cena sob o risco iminente de incêndio que poderia ter se alastrado aos veículos.

Nada disso aconteceu pela ação imediata dos que ali estavam, presos no trânsito, e que fizeram uso dos extintores de incêndio de seus automóveis, naquele tempo um item obrigatório.

Ficou assim o helicóptero com o qual caímos na Marginal do Pinheiros, em 11 de novembro de 2005

Cerca de um ano depois, saiu o laudo da perícia realizada pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos - Cenipa: "Correias da embreagem se romperam e na ausência delas o motor parou de funcionar".

Como a cabine do helicóptero resistiu, o piloto Leonardo Rebuffo e o repórter aéreo que estava a seu lado, escaparam sem nenhum arranhão.

     Se ficamos assustados? Claro que sim, mas na hora ninguém pensou na morte, só na vida

Depois da queda, ainda dentro cabine tombada na pista, dei graças a Deus por continuar vivo e ileso. 

Ainda pendurado pelo cinto de segurança e quase de cabeça para baixo fiquei sobre o piloto, Vi que ele estava bem, porque se desvencilhou rapidamente do cinto e saiu pela porta do meu lado, passando por cima de mim sem esbarrar.

Não pensou em pedir ajuda a ninguém para me tirar de dentro do helicóptero, pegou seu telefone celular e ligou para a empresa responsável pela aeronave.

Eu, paraplégico, vítima da paralisia infantil, continuei na cabine porque não conseguia sair sozinho. Com sequelas nos braços e nas pernas, minha luta naquele momento era contra a força da gravidade.

Consegui apenas desatar o cinto de segurança e me senti mais cômodo, foi quando algumas pessoas começaram a gritar. "Vai pegar fogo"! 

Havia pipocos, pequenas explosões causadas por alguns pingos de gasolina sobre o cano de escapamento e aquilo me assustou. Não fosse a pronta ação dos motoristas que usaram os extintores de seus carros meu destino poderia ter sido outro. 

Em meio à movimentação, aparece um rapaz que abre a porta do helicóptero, me levanta pelas axilas e me retira da cabine.

Ao ser erguido por ele, notei que a minha bota ortopédica estava presa na fuselagem do helicóptero, o moço também percebeu e deu um jeito de me retirar sem danificar minhas órteses.

“Agora, se segure com as duas mãos no meu pescoço para que eu possa te tirar daí, não tenho como te colocar no chão, há muita gasolina esparramada”. Essas foram as recomendações dele.

Fiquei admirado com a sensibilidade dele que nunca tinha me visto na vida e mesmo assim notou as sequelas de minha deficiência física. Me erguendo  com docilidade, deu a impressão de me conhecer há anos.

Cesar Tavares Lugo foi, naquele momento, um verdadeiro irmão a quem irei agradecer pelo resto da vida. Gostaria de revê-lo, porque com o passar do tempo ele mudou seu número de telefone e perdi o contato.

O nome dele não aparece em nenhuma rede social, se alguém souber de seu paradeiro, favor avisar.


Depois de me carregar nos braços, me colocou sentado no guard - rail à beira da pista da marginal e ali fiquei por alguns minutos desorientado.

Sem saber o que fazer, cercado de motoboys que me perguntavam o que havia acontecido com o helicóptero, me vi aturdido e sem nenhum meio de me comunicar com alguém. Tudo o que havia na aeronave ficou danificado.

Eis que então, o mesmo rapaz aparece e me oferece uma carona em seu carro, dizendo que me levaria até onde eu precisasse ir.

Expliquei o meu destino, o endereço da Rádio Eldorado na Avenida Engenheiro Caetano Álvares, 55 - bairro do Limão, sede da emissora.

Ao chegar fui abraçado pelos colegas de trabalho, todos preocupados e ainda sem saber o que havia de fato acontecido comigo.

Entramos no estúdio e passamos a explicar aos ouvintes do Jornal Eldorado os motivos do helicóptero ter que descer em plena Marginal do Pinheiros.

"Senti cheiro de borracha queimada na cabine e uma luz amarela se acendeu no painel, em seguida o comandante Leonardo começou a procurar um lugar para descer. Sobrevivemos graças à habilidade do piloto e daqueles que fizeram uso de seus extintores de incêndio", fiz questão de ressaltar.

Pelo microfone agradeci, em especial, ao irmão de coração Cesar Tavares Lugo ainda ao meu lado. Também ele foi entrevistado sobre a ocorrência pelo âncora Caio Camargo.

O acidente repercutiu no País todo, ganhou destaque nos noticiários de TV e foi primeira página em todos os jornais impressos do dia seguinte.


           O Estadão exibiu fotos do helicóptero na edição do sábado, 12 de novembro de 2005

Ganhamos notoriedade. Cesar Tavares Lugo e eu fomos procurados pelo Globo Repórter e participamos do Programa do Jô, entre outros programas.

Graças às perguntas engraçadas do apresentador, demos risada da situação. Embora tenham sido momentos difíceis, houve um final feliz.

Na entrevista para Jô Soares, Cesar contou que mora em Bauru - SP e de tanto ajudar pessoas em situações de emergência, precisou fazer um curso de primeiros socorros.

"Incrível, parece que os acidentes escolhem o lugar onde estou para acontecer", comentou. Em seguida disse que certa vez, passando perto de uma fazenda, viu um avião descer em um campo onde vacas pastavam. Se dirigiu até o local, havia pessoas feridas e ele prestou ajuda.

O tempo foi passando e a rotina em nossas vidas foi retomada. Somente depois, é que fiquei sabendo das curiosidade da numerologia em relação ao primeiro algarismo. As previsões deram certo para mim e para o piloto Leonardo naquele dia 11 de novembro de 2005. 

A solidariedade de todos os envolvidos naquele acontecimento auxiliou a nós dois sobremaneira.

Alguns amigos disseram que nasci de novo. Tenho agora, portanto, dois aniversários: 1° de junho e 11 de novembro. Número 1 em dose dupla.

Sugiro que a data 11 de novembro passe a ser celebrada como Dia Mundial da Solidariedade. Quem sabe alguém ou alguma entidade abrace essa ideia.

Voltei a voar com o comandante Leonardo cerca de 40 dias depois. Foi no plantão da tarde do dia de natal daquele ano, 25 de dezembro, um domingo.

Foi um voo tenso para nós dois, parecia que cena iria se repetir, mas não aconteceu nenhuma irregularidade. 

Ainda voei mais cinco anos para a Rádio Eldorado, encerrei minha carreira de repórter aéreo em 7 de dezembro de 2010. 

Depois pela mesma empresa atuei como âncora e apresentador até 2015 no projeto Rádio Estadão.

Sigo trabalhando como jornalista home office, prestando consultoria a novos escritores, escrevendo ou revisando livros para as editoras. 

Seguem na memória as recordações das aventuras que passei. De vez em quando as coloco neste blog.

Para que vocês leitores também recordem, seguem fotos tiradas naquele helicóptero para a Revista Asas, em 2005.





Grande abraço a vocês, leitores e leitoras deste blog. Comentem se possível.