terça-feira, 31 de janeiro de 2023

Do Municipal à CET: Uma breve história do trânsito de São Paulo

Quem mora em São Paulo e nunca ficou parado em um congestionamento que atire a primeira pedra! 

Dia desses, um leitor deste blog e nosso ouvinte de outros tempos, Eduardo Nascimento, me pediu que contasse a história do trânsito na capital paulista.

Achei interessante a solicitação, porque são poucos na cidade, com exceção dos engenheiros e técnicos, além dos jornalistas especializados em mobilidade urbana, que se interessam pelo assunto.

Para o cidadão comum, o bom mesmo é se livrar dos engarrafementos e chegar logo ao destino. Mas nem sempre é assim.

O primeiro congestionamento de São Paulo, noticiado pelos jornais, aconteceu na noite da inauguração do Teatro Municipal, em 12 de setembro de 1911.

Na época, a cidade contava apenas com 300 carros registrados e desses, cerca de 100 automóveis conduziram seus proprietários ao espetáculo inaugural que trouxe a leitura de um trecho da obra de Carlos Gomes, “O Guarani”.

Em seguida, houve a apresentação da ópera de Ambroise Thomas, “Hamlet”, com o cantor lírico Titta Ruffo no papel principal.


O jornal Correio Paulistano trouxe que as ruas Barão de Itapetininga e Xavier de Toledo ficaram lotadas de carros enfileirados, desde o Municipal até a Praça da República.

O escritor Jorge Americano, que morava em Santa Cecília, foi ao teatro, mas antes teve que assistir a essa primeira complicação viária e deixou para o jornal, seu testemunho:

“Às oito o landau estava parado na nossa porta. Vinte mil reis para levar, esperar e trazer. O cocheiro disse que a coisa estava ruim para ir até lá. Atingimos a Praça da República às oito e meia. Quando fomos entrando pela rua Barão de Itapetininga tudo parou. Chegamos ao Municipal às 10 e 15, no começo do segundo ato. Mas ninguém teve a iniciativa de descer e seguir a pé. Seria escandaloso.”

Por causa do trânsito, o espetáculo atrasou e a ópera não chegou até o final. O último ato foi suprimido em razão do horário.

Na saída, tudo parou novamente e Jorge Americano, disse também, que chegou de volta em casa às 2h30 da madrugada.

Tais acontecimentos não impediram que o carro particular se transformasse na grande paixão dos paulistanos.

Outra reportagem do mesmo jornal, em 1915, aponta que durante um corso carnavalesco, a Avenida Paulista naquele mês de fevereiro, ficou repleta de “veículos motorizados”.

Durante as décadas de 1920 e 1930 circuitos improvisados foram montados para a realização de corridas.

Em um desses circuitos, entre as avenidas Paulista e Brasil, aconteceu um sério acidente que vitimou pessoas e envolveu a corredora Helle Nice, muito conhecida na época.

Todos os fatos dessa corrida foram narrados pelo locutor Nicolau Tuma, em uma “irradiação” feita por ele, para a antiga Rádio Difusora.

As provas em circuitos improvisados terminaram com a inauguração do autódromo de Interlagos, em 1939.

No livro “Anarquistas Graças a Deus”, a escritora Zélia Gattai, faz menção às corridas em circuitos interligando cidades, os chamados rides. 

Na prova entre São Paulo e Tatuí, o pai dela, Ernesto Gattai, venceu a primeira disputa, mas em uma revanche, a pedido de um adversário, sofreu um acidente que quase o deixou paralítico.


Na década de 1960 os congestionamentos se intensificaram, resultado da implantação da indústria automobilística no País e os bondes foram retirados de circulação. Considerados obsoletos, dizia-se que atrapalhavam o trânsito.

Em 9 de fevereiro de 1967, a direção do DET - Departamento Estadual de Trânsito, foi entregue ao coronel Américo Fontenelle,  pelas mãos do então governador Abreu Sodré.

O objetivo era dar um jeito na coisa e Fontenelle que havia melhorado o trânsito do Rio de Janeiro, se transferiu para São Paulo.

Mas o coronel, apesar da disposição disciplinadora, tomava decisões de um dia para o outro, sem comunicar as mudanças com a devida antecedência.

“Fontenelle mudava os pontos finais dos ônibus e as mãos de direção, do jeito que bem entendia, sem avisar a população pela imprensa, rádio ou televisão nos explicou em uma entrevista, o arquiteto e urbanista José Eduardo Assis Lefèvre, estudioso das ideias do coronel.

Vias de tráfego como a 23 de Maio e a Radial Leste, ainda não existiam. Então, o coronel distribuiu o fluxo de tráfego em duas rótulas:  Principal e Complementar. Estas girariam em sentidos opostos e em mão única. A chegada ao centro ficou assim facilitada.

Avenidas como a Mercúrio, Senador Queiroz e Ipiranga que já estavam alargadas, passaram a ter sentido único e assim permanecem até hoje, mas o retorno, ficava praticamente impossível.

Todo o tráfego do fim de tarde era canalizado em ruas estreitas como a Santo Antônio, Jaceguai, Abolição e dos Estudantes.


Além disso, Américo Fontenelle gostava de multar e mais do que isso, mandava murchar os pneus dos veículos estacionados irregularmente. Isto fez dele, 
persona non grata entre os paulistanos.

Sua presença na direção do DET foi de apenas três meses, mesmo assim, entrou para a história da cidade devido à polêmica que gerou.

“Fontenelle foi importante a São Paulo por plantar a semente do planejamento de trânsito”, disse o professor Lefèvre.


Apesar de toda a discussão que as mudanças trouxeram na época, outras rótulas implantadas pelo coronel continuam em operação, como é o caso da mão única no sentido bairro pela Rua Maria Paula e Viaduto Dona Paulina.

Também houve a proibição do trânsito nas ruas do velho centro que depois seriam transformadas em calçadões e essa, é uma outra decisão de Fontenelle que permanece de pé. 

Entre os anos 1960 e 1980, jovens apaixonados por carros ocupavam a Rua Augusta para exibir suas máquinas e promover a paquera, mas isso agora é coisa do passado.

O trânsito de São Paulo passou a ser administrado pela CET - Companhia de Engenharia de Tráfego, a partir de 1973, quando se iniciaram as obras do Metrô linha Norte-Sul Azul.

Na data que coincide com o nome de uma de suas principais avenidas, em 23 de maio de 2014, todas as marcas de congestionamento registradas até então pela CET foram superadas.

Segundo os boletins da companhia, a cidade de São Paulo, registrou naquela data, o recorde histórico de 344 km de vias congestionadas simultaneamente. 

Sempre motivo para reclamações, principalmente pelo fato de seus agentes multarem bastante, a CET é odiada por muitos paulistanos. Para essas pessoas, costumo dizer: “Ruim com ela, pior sem ela”.

Caso a CET venha a ser privatizada, como pedem alguns, imagino que os novos gestores continuarão multando e podem até implantar pedágios urbanos, porque as empresas privadas precisam lucrar.

Sabemos que trânsito parado só traz prejuízos, mas acho melhor deixar tudo como está. Entenderam?


Fontes: Portal São Paulo em Foco, Portal Mobilize e BN Digital Brasil


segunda-feira, 23 de janeiro de 2023

São Paulo - 469 anos: Comemorar o quê?

Eis que chega mais um 25 de janeiro, aniversário de São Paulo - 469 anos.

Graças a Deus seguimos vivos mesmo diante da pandemia, da desgastante campanha eleitoral mais polarizada da história, apesar de ter assistido a eliminação do Brasil, em mais uma Copa do Mundo e de assistir as maldades carregadas de ódio e rancor distribuídas através das "redes insociais".


Nem tudo o que se lê no WhatsApp é confiável, quando a notícia é preparada por um profissional, são citados os nomes dos entrevistados ou das fontes de informação. A mídia de verdade possui nome, endereço e CNPJ.

“Para se noticiar, é preciso antes checar a informação”, dizia exaustivamente, Fernando Vieira de Mello (1929-2001) diretor de jornalismo durante décadas da saudosa rádio Jovem Pan nos tempos em que a emissora apresentava a Sinfonia Paulistânia, de Billy Blanco, como fundo musical de seu noticiário.


O aniversário de São Paulo este ano serve sim como reflexão: Existem ainda motivos para se festejar esta data? Os costumes se modificam, isto é natural. Só que uma parte da população se fechou nos apartamentos e está individualista demais.

A sociedade atual coloca os filhos nas creches, os pais nos asilos e depois desfila pelas calçadas para exibir os cães de estimação. Tomem cuidado; o que se planta, é aquilo que se colhe depois. 

Nossa sorte é que as boas sementes lançadas no passado ainda frutificam no meio empresarial graças às oportunidades que sempre surgem de se alcançar um bom emprego. As melhores escolas, hospitais e universidades permanecem em São Paulo e por isso as pessoas vão ficando.

Mas durante o ano que passou luzes amarelas de alerta se acenderam apontando para o ressurgimento de antigos preconceitos.


As contradições aumentaram e a convivência de dois Brasis dentro de uma só metrópole está cada vez mais difícil. Basta ver a Favela Paraisópolis e o Portal do Morumbi.

O velho centro se transformou de vez em refúgio das famílias sem moradia e dos frequentadores da cracolândia que envergonham a todos nós.

Ao mesmo tempo, a Nova Faria Lima, se apresenta como símbolo da modernidade do mercado de capitais. 

São Paulo é a filha mais rica e a mais pobre de toda a nação. Basta circular pela Oscar Freire, fazer um rolê no Shopping JK e depois seguir em uma condução lotada até o Jardim Pantanal. Descobre-se neste trajeto, um resumo do que é o Brasil em apenas um dia.

Certa vez alguém me disse, acho que foi Lourenço Diaféria (1933-2008), o mais apaixonado cronista paulistano que conheci:

“Para se entender São Paulo, é preciso lembrar do apóstolo que deu o nome para esta cidade. Ao sentir o que Jesus queria dele, viu cair escamas de seus olhos...” Está em Atos 9-18.



“... Para entender São Paulo, nós também precisaremos perder as escamas dos nossos olhos.”

Pena que a frase foi dita pelo cronista já faz algum tempo, quando ainda havia esperanças de se ter um povo mais solidário.

Já houve solidariedade humana em São Paulo, mas me parece que ela anda escondida. Por isso, a cidade está carente de bons olhos. 

Quase ninguém mais observa São Paulo com o olhar do coração, como fazia o mestre Lourenço Diaféria.



Este ano não vejo motivos para comemorar, mesmo assim; Feliz Aniversário, sofrida cidade de São Paulo!

 

 

 

terça-feira, 17 de janeiro de 2023

Confira nas fotos, casas e lugares de São Paulo que não existem mais

São Paulo vai completar 469 anos e todas as vezes que a cidade aniversaria, me lembro de coisas e lugares que não mais existem.

Quando menino, na década de 1960, cheguei a viajar de bonde pela cidade, por isso guardo na lembrança imagens como esta.

Uma paisagem que não cheguei a ver é esta, porque a fotografia da Avenida Angélica, coberta de paralelepípedos, foi feita em 1940.

Naquela época para fazer a entrega do pão e do leite nas residências, os padeiros utilizavam uma carroça semelhante à que vemos acima.

Daqui imagino o sacrifício do cavalo com suas ferraduras a subir esta ladeira íngreme em uma manhã chuvosa e de piso escorregadio.

Também não é do meu tempo a Igreja da Consolação sendo construída. Essa imagem nos remete à década de 1930.

Ao lado havia um convento de padres que servia também de concentração para os jogadores do recém-fundado, São Paulo Futebol Clube, sob as bençãos de Monsenhor Bastos, sócio-fundador do nosso querido e hoje sofrido tricolor paulista.

No detalhe da foto, aparece um homem atrás do caminhão fazendo xixi.

Dessa cena urbana alguns ainda se lembram: Viaduto Santa Ifigênia aberto ao tráfego de veículos na década de 1960.


O Colégio Marista Nossa Senhora do Carmo foi demolido desnecessariamente no início dos anos 1970 para dar lugar a uma das saídas da Estação Sé do Metrô, só que depois o projeto foi modificado.

No lugar hoje existe somente a entrada do Poupatempo Sé e uma placa alusiva ao antigo colégio, colocada pelos ex-alunos.


Quanto a essa caravela construída na década de 1970 em uma rua ao lado da Avenida 23 de Maio, para funcionar um restaurante, já não há mais nenhum vestígio. No lugar foi levantado um edifício como tantos outros.


Em 1989, no início da minha atividade de repórter aéreo, cheguei a ver de pé, o casarão da Família Matarazzo na Avenida Paulista.

Tombado pelo Patrimônio Histórico, a contragosto da família, parte do imóvel foi demolida em uma das madrugadas daquele ano.

No decorrer de 1994, após longa batalha judicial, a família conseguiu reverter o tombamento e reaver para si o terreno.

O espaço abriga hoje uma torre de escritórios, além do Shopping Cidade de São Paulo, pelo qual não tenho muita simpatia.

Abri e finalizei essa postagem com fotos da Estação da Luz, um dos poucos lugares tradicionais ainda não modificado.

Por causa disso recomendo: Fotografe São Paulo, porque aqui tudo muda rapidamente.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

População paulistana em risco: Vem aí o Uber Moto

Ano Novo, Vida Nova!

Todo início de ano é assim, as atenções da mídia se voltam para o trânsito por ser início de ano, período de poucas notícias por causa das férias e dos recessos no legislativo e judiciário.

O trânsito é um assunto problemático que sempre desperta polêmicas, mas desta vez a discussão vai ser grande

Já ouviram falar do Uber Moto?


Por este novo serviço por aplicativo, você chama o condutor que te dá uma carona em sua moto. 

O Uber Moto foi lançado nesta primeira semana de janeiro em São Paulo e também no Rio de Janeiro, onde o trânsito da mesma forma que aqui também é uma loucura.

A modalidade chegou ao Brasil em 2020 e já está presente em cerca de 160 municípios brasileiros, mas nada se compara ao tráfego das duas maiores capitais do país.

Somente na cidade de São Paulo, em 2020, quase 350 motociclistas morreram em acidentes dentro do perímetro urbano e em 2021 foram 394 mortes, média de 1,8 por dia, aumento de 16% entre um ano e outro, conforme o Infosiga.

Tudo isso, sem contar os 6.548 motoboys com ferimentos graves que hoje se recuperam das sequelas sofridas nos centros de reabilitação pagos pelo SUS.

A prefeitura paulistana informa que foi pega de surpresa e determinou que a empresa Uber seja notificada, e que o serviço ficará suspenso, pois ainda não está regulamentado no âmbito municipal.

Para os especialistas, antes de começar a usar o aplicativo de forma profissional, os motociclistas precisam:

1.    Passar por uma série de cursos sobre a condução de passageiros

2.    Aprender a realizar primeiros socorros

3.    Entender a regulamentação de trânsito de cada município

4.    Passar por verificações periódicas

5.    Fazer manutenção da motocicleta

6.  Saber pilotar com garupa e passar por testes de habilidade


Na opinião deste repórter agora blogueiro, que tem acompanhado a situação do trânsito há mais de três décadas, transportar pessoas em uma moto, é bem diferente de se transportar mercadorias ou mesmo pizzas.

Existem passageiros que nunca andaram de moto e mesmo para quem viaja na garupa, é preciso ter um certo preparo.

Muitas pessoas nem se dão conta do risco que estão correndo ao embarcar como passageiras em uma motocicleta.

No carro se aprende a dirigir, na moto se aprende a pilotar. Percebem a diferença?

Justamente agora que a implantação da Faixa Azul em São Paulo, começa trazer bons resultados, surge essa nova polêmica.

A Faixa Azul estabeleceu para as motos a circulação por um “corredor exclusivo” à esquerda na Avenida 23 de Maio e mais recentemente, na Avenida dos Bandeirantes.

Esta regulamentação completou um ano, agora neste mês de janeiro, com a aprovação de 93% dos motociclistas e redução dos acidentes graves e mortes.

Atualmente, existem 1,3 milhão de motos circulando na Capital e, conforme o último balanço divulgado pela Secretaria Municipal de Transportes – SMT, não foram registradas mortes desde então nessas avenidas.


O avanço em termos de segurança, obtido pelas Faixas Azuis pode enfrentar um retrocesso se o Uber  para as motos for regulamentado.

Em nota, a empresa que promove caronas através de seu aplicativo, informou que já oferece viagens de moto desde novembro de 2020, em várias cidades brasileiras, mas nada se compara a São Paulo em volume de tráfego

“A modalidade está presente na região metropolitana desde o ano passado”, informa a Uber. Em diversas cidades brasileiras existem há anos serviços de Moto-Táxi, onde o conflito entre carros e motos é bem-menor. 

Há uma lei federal que regulamenta esses serviços no país e que pode ser adaptada de acordo com a legislação de cada município.

Entendo que a população paulistana que se aventurar a esse tipo de transporte correrá risco de morte. Não exagero em dizer que se trata de mais uma “tragédia anunciada”, caso de fato essa proposta seja aprovada.

Depois, não digam que não avisei! De todo modo faço votos para que todos e todas tenham, um feliz ano novo sem abusar da velocidade.



 

Fontes: Infosiga, Imprensa CET/SMT, Estadão Bairros e Portal G1