sábado, 25 de novembro de 2023

Vila Alpina de terras históricas corre o risco de crescer demais

A Vila Alpina é progressista e bela, foi fundada por um italiano empreendedor chamado Vicente Giacagline, era ele um terrenista, termo usado na época para designar os que compravam grandes glebas e depois loteavam.

Essa atividade revela que o empreendedorismo não é coisa nova, pois já existia na São Paulo da década de 1920.

Com a criação da CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, em 1943, vários sindicatos foram fundados, entre eles o Secovi-SP, para representar os terrenistas, substituídos mais adiante pelas construtoras de edifícios.

Não existem mais terrenistas na cidade de São Paulo, mas a história da Vila Alpina ajuda explicar a evolução do mercado imobiliário e como ele trabalha.

O italiano Giacagline gostou das terras que adquiriu, dizia que lhe trazia lembranças dos Alpes da Itália, por isso não teve dúvida de batizar o empreendimento com o nome Vila Alpina.

Isto aconteceu em 1921, os primeiros registros de escrituras do loteamento Vila Alpina são do dia 3 de setembro daquele ano e desde então nessa data se comemora o aniversário do bairro.

Antes, as mesmas terras tiveram relação histórica com a fundação de São Paulo porque no século 16, fizeram parte da sesmaria de João Ramalho que incluia a primitiva Santo André da Borda do Campo que não vingou como cidade e nada tem a ver com a Santo André atual.

Era preciso construir habitações mais adiante para servirem de ponto de partida para o interior e isso levou à escolha das Terras de Piratininga por Martim Afonso de Souza.

Em comum acordo com os jesuítas, o donatário da capitania de São Vicente, decidiu implantar no mesmo lugar que serviria de ponto de partida para os bandeirantes, um colégio de padres.

Da decisão surgiu a São Paulo de Piratininga de Manuel da Nóbrega,  José de Anchieta e mais adiante de Antônio Raposo Tavares e Fernão Dias Paes.


Em 1829, as terras pertencentes à atual Vila Alpina aparecem em documentos de propriedade de um português chamado João Pedroso que dividiu toda área em fazendolas para criação do gado e o cultivo de hortas e frutas, mas antes ainda do final do século 19, a região começou a ganhar outras feições.

Parte dos sítios foi retalhada para dar lugar a pequenas olarias, um nascente negócio que se tornaria lucrativo ao longo dos anos, embora a Vila Alpina mantivesse ainda aspectos rurais.

A partir da chegada do italiano Vicente Giacagline, a venda de lotes se expandiu pela forma facilitada de prestações a perder de vista para possibilitar aos novos proprietários, a construção de suas casas.

Como a Vila Alpina faz divisa com São Caetano, que por sua vez pertencia à Santo André, a distância entre o novo bairro e a estação de trens era curta e isso facilitava a vida dos moradores.

Depois com a chegada da indústria automobilística ao ABC, quase no final da década de 1950, a Vila Alpina passou a abrigar as famílias de vários funcionários das fábricas e se tornou um bairro residencial. 

Dali em diante todas as chácaras e olarias ainda existentes foram desfeitas e seus terrenos ocupados por mais residências.

Em 1974 uma novidade veio sacudir a calma da Vila Alpina, a prefeitura decidiu erguer na Avenida Francisco Falconi, um crematório ao lado do cemitério já construído.

Ninguém sabia direito o que era aquilo, foi o primeiro da América Latina, dentro de uma área verde de 134 mil metros quadrados.

O Crematório da Vila Alpina hoje é uma realidade, atualmente acontecem dezenas cremações diárias em quatro fornos.

Isso já não atrapalha a rotina do bairro, ao contrário, a Vila Alpina se expandiu e agora com acesso fácil ao Metrô e ao Monotrilho tende a se crescer ainda mais. Daí as dúvidas.

Com as mudanças aprovadas pelo novo Plano Diretor e as consequentes alterações na Lei de Zoneamento Urbano, não se sabe direito quais serão os rumos do crescimento de Vila Alpina daqui em diante.

A ideia de verticalizar mais ainda regiões próximas às estações do Metrô, Trens e Monotrilho pode, além da saturação no trânsito, trazer transtornos à qualidade de vida da população e o momento é de expectativa.


Algumas entidades representativas dos bairros se mobilizam para um protesto dia 30 de novembro, em frente à Câmara Municipal, contra as alterações previstas na Lei de Zoneamento Urbano.

População da Vila Alpina, com certeza preocupada, aguarda ansiosa


segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Pompeia e Perdizes, bairros irmãos na história e nos fatos interessantes

Houve um período em que me dediquei a escrever crônicas sobre os bairros paulistanos colocando como recheio nos assuntos, alguns acontecimentos históricos.

Dias atrás quando choveu mais forte e faltou energia elétrica, sem ter como trabalhar, ocupei meu tempo lendo antigos textos guardados em um pen drive.

Entre os artigos encontrei este que aborda Perdizes e Pompeia, bairros vizinhos e muito próximos culturalmente que nos deixam em dúvida sobre em qual desses dois territórios estamos. 

Me lembro sempre de Lourenço Diaféria, adorável cronista, que dizia morar nas Perdizes para assim fazer lembrar as tradições do nome daquele lugar.

A denominação veio por causa de dona Tereza de Jesus Assis, casada com o vendedor de garapa, Joaquim Alves Fidelis.

Por volta de 1850, o casal era conhecido por vender perdizes criadas no quintal da casa onde moravam, localizada no lugar onde hoje se encontra a saída da Via Elevada, conhecida por Minhocão.

Sob o olhar atual poderíamos dizer que tudo o que está à direita da Avenida Sumaré, no sentido da Marginal do Tietê, é Perdizes e tudo à esquerda é Pompeia. Concordam comigo?

Na geografia da prefeitura, entretanto, a divisão é diferente. A Rua Diana é quem separa as Perdizes de Pompeia e uma de suas travessas, a Rua Wanderley, serve de divisa com o Sumaré.

Sumaré, palavra extraída do idioma tupi significa, “orquídeas silvestres” e a foto acima, mostra a construção da avenida que leva o nome do bairro da saudosa TV Tupi sendo construída, em 1969.

Nos registros oficiais o antigo nome Vila Pompeia, é o que vale. Conforme os historiadores que ouvi, a denominação não tem a ver com a cidade romana devastada pelo Vesúvio.

Foi, na verdade, uma homenagem a Aretusa Pompeia, esposa do Dr. Augusto de Miranda, empreendedor que loteou o bairro e batiza uma das movimentadas ruas da região.

Apesar da outra vizinha ser a Vila Romana, nada em nenhum documento comprova qualquer alusão à cidade arrasada e morta pela poeira do Vesúvio que séculos depois engoliria o deputado Silva Jardim.

Antônio da Silva Jardim (1860-1891) foi um político republicano do século 19 que ao visitar a Itália, quis conhecer o Vesúvio de perto. Subiu até a borda e após chegar caiu dentro do vulcão e morreu.

O guia que o levou até lá e outras testemunhas disseram que o Vesúvio estava inativo, mas naquele exato momento, a terra tremeu.

Sobre a paulistana Perdizes, em frente à saída do Elevado, está a paróquia de São Geraldo Magela, cujo endereço oficial ainda é o Largo Padre Péricles, lugar do antigo quintal de criação das aves de dona Tereza de Jesus.

No alto da torre dessa igreja está o sino da primitiva igreja do Largo da Sé, que badalou para anunciar a Proclamação da Independência do Brasil, na tarde do 7 de setembro de 1822.

Na madrugada de 25 de novembro de 2003, há exatos 20 anos, ladrões entraram nessa igreja, subiram até a torre e furtaram o badalo do sino.

A polícia foi chamada e na época, o pároco responsável pediu para que devolvessem o badalo, cujo peso aproximado era de 60 quilos.


Provavelmente os ladrões acharam que daria para se extrair ouro do objeto, mas o padre explicou que se tratava de bronze misturado a outros metais sem muito valor comercial.

De nada adiantou os apelos do sacerdote porque até hoje o badalo não foi devolvido e tiveram mesmo que arranjar um outro.

Com isso, o som original do sino ouvido no dia da Independência, deixou de ser o mesmo. Cada badalo oferece aos sinos sons diferentes, sabiam disso?

Verdade também é que hoje quase não se ouvem mais sinos de igrejas, outros sons tomaram conta do cotidiano da cidade.

Ainda bem que Perdizes e Pompeia não mudaram de nome, permanecem bairros vizinhos de convívio fraterno e franco em meio ao trânsito avassalador de sempre. 

Sorte dos moradores, é que ainda se encontra paz ao se visitar o Parque da Água Branca e seus viveiros.

Com certeza ainda existem por lá as originais perdizes que deram nome ao bonito bairro que temos hoje.




quarta-feira, 15 de novembro de 2023

O Hino Nacional Brasileiro é um plágio? Ludmilla reabre polêmica

Durante a cerimônia de abertura do Grande Prêmio São Paulo de F-1, a cantora Ludmilla, convidada para interpretar o Hino Nacional Brasileiro, esqueceu a letra e fez todo mundo passar vergonha.

Por causa do acontecimento lamentável, voltaram às redes sociais as conversas de que a canção do nosso hino é plágio de alguma composição clássica.


A bola da vez passou a ser a ópera 'Don Sanche', de Franz Liszt, que possui um trecho de fato muito parecido ao hino composto pelo maestro Francisco Manuel da Silva.

Fiquei curioso em saber a verdade, para esclarecer minhas dúvidas telefonei para o “curioso-mor”, meu colega Marcelo Duarte, autor do Guia dos Curiosos.

O Marcelo também se mostrou surpreso e como resposta, me indicou um vídeo apresentado pelo maestro Alexandre Innecco, que possui um canal no Youtube e dá seus pitacos sobre querelas musicais.


Para o maestro as semelhanças com a ópera ‘Don Sanche’, não configuram plágio primeiro porque algumas notas se parecem apenas em um trecho da melodia. 

Outra razão foi que a obra resultou em um grande fracasso e jamais foi exibida no Brasil do século 19. “Suas partituras não foram trazidas ao nosso país, não haveria como plagiar uma obra desconhecida”.

Não existe, entretanto, uma certeza sobre a data exata da composição do Hino Nacional Brasileiro.

Algumas versões apontam para 1822, logo após a Proclamação da Independência, outras para 1831, ano da abdicação de Dom Pedro I e seu retorno a Portugal.


Quanto à letra composta pelo poeta Joaquim Osório Duque Estrada, sua associação ao hino se deu muitos anos depois após um concurso para a escolha, realizado em 1909.

Somente durante as comemorações do Centenário da Independência do Brasil, em 1922, o Hino Nacional Brasileiro foi oficializado por decreto para sua execução em cerimônias públicas.

A ópera ‘Cinderela’, ou em italiano, ‘La Cenerentola’, de Gioacchino Rossini traz também semelhanças ao hino brasileiro, assim como trechos da obra do padre José Maurício Nunes Garcia, considerado um dos maiores compositores clássicos do Brasil.


Para o maestro youtuber Alexandre Innecco essas semelhanças também não configuram plágio e sim “coincidências musicais”. Sendo assim, fim de papo.

No livro “República ou Morte! Viagens em Busca de Hinos Nacionais”, o autor Alex Marshall revela uma série de semelhanças melódicas envolvendo outros países.

Alguns desses “plágios” possuem raízes históricas com melodias tradicionais de compositores desconhecidos.

Em outras situações, há quem suspeite de, digamos, excesso de inspiração por parte do compositor.

Verdade mesmo é que toda essa polêmica reacendeu por culpa da cantora Ludmilla que se tivesse vergonha, teria pelo menos devolvido o dinheiro do cachê que recebeu, visto que não soube cantar a música para a qual foi contratada. 

Como disse meu amigo jornalista Gabriel Kwac, “poderia pelo menos ter levado uma colinha”.

Assista agora o vídeo postado pelo maestro Alexandre Innecco:


Outras fontes:
https://g1.globo.com/mundo/noticia/2015/08/sete-hinos-nacionais-suspeitos-de-plagio.html

https://radios.ebc.com.br/concerto-mec/2021/01/confira-opera-cinderela-de-gioacchino-rossini-e-o-concerto-para-violoncelo-de

terça-feira, 7 de novembro de 2023

Curiosidades sobre Castro Alves, o poeta que mais dá nomes a ruas e avenidas

Quase todas as cidades brasileiras possuem ruas ou avenidas que se chamam Castro Alves e na capital paulista, uma rua da Aclimação, obteve o nome do poeta romântico do século 19 que defendeu as causas sociais do seu tempo.  

O historiador Odécio Bueno de Camargo aponta em seu livro publicado em 1949, “Castro Alves Estudante em São Paulo” que o magistral “Navio Negreiro”, foi concluído pelo autor nas terras de Piratininga.

Tal informação contraria Afrânio Peixoto, principal biógrafo de Castro Alves, ele define a conclusão em Recife, onde o poeta iniciou seus estudos em Direito. Na capital dos paulistas levou vida de aluno relapso, mas foi  aprovado no final do ano.

Apaixonado pela atriz portuguesa Eugênia Câmara, viveu com ela uma difícil relação amorosa que culminaria com a separação em São Paulo, após traição dela. Depois, aconteceu a tragédia do ferimento que o obrigou a amputar o pé esquerdo.


Antônio Frederico de Castro Alves, nasceu no dia 14 de março de 1847, em Curralinho – BA, que desde 1881 leva seu nome. Lá passou parte da infância em uma fazenda e ao se tornar adolescente sentiu o desabrochar da poesia tendo aos 15 anos publicado seus primeiros versos.

Estudante de Direito, passou a ser notado nas sessões públicas da faculdade em Recife, ao recitar às plateias. “Quando nas praças se eleva do povo a sublime voz, um raio ilumina a treva, o Cristo assombra o algoz…”

Surgia para os brasileiros, o poeta do povo e dos escravizados.

... Deus! ó Deus! onde estás que não respondes? Em que mundo, em qu'estrela tu t'escondes,,, Senhor Deus dos desgraçados! Dizei-me vós, Senhor Deus! Se é loucura... se é verdade, tanto horror perante os céus? São os filhos do deserto, onde a terra esposa a luz, onde vive em campo aberto a tribo dos homens nus..”


Em Recife conheceu o jovem Ruy Barbosa também aluno e, por discordâncias com um professor, os dois se transferiram para São Paulo e deram continuidade aos estudos, o poeta tinha então  21 anos.

Antes, aos 17, conhecera Eugênia Câmara, atriz portuguesa de grande talento, 11 anos mais velha, capaz de interpretar, dirigir e escrever roteiros teatrais, capacidade essa que nenhuma atriz brasileira da atualidade possui.

Eugênia impulsionou Castro Alves aos ideais abolicionistas, viveram e encenaram juntos nas terras de Piratininga e foi nesta cidade que aconteceu  a separação do casal seguida da dolorosa tragédia pessoal ocorrida com ele.

Ao sair com amigos para uma caçada, passeio comum daquela São Paulo de outrora, o jovem poeta levou consigo uma espingarda pendurada no ombro com o cano voltado para baixo.

Ao saltar sobre uma valeta, a arma disparou e o atingiu violentamente no calcanhar do pé esquerdo.

Socorrido, passou depois meses hospedado em uma casa da Rua do Imperador, onde está hoje a Praça da Sé, na esperança de alcançar melhora no ferimento, mas o pé precisou ser amputado.

Como já sofria dos males da tuberculose, tinha pulmões fracos e não foi possível fazer uso do clorofórmio, único meio anestésico até então.

O poeta enfrentou o martírio da amputação acordado, teve apenas um lenço para morder a fim de mitigar a dor, disseram seus médicos, também professores de medicina.

A cirurgia realizada nos primeiros dias de junho de 1869, no Rio de Janeiro, foi noticiada pelo jornal paulista Ypiranga, em 21 de julho daquele ano.

Desse acontecimento tem início a convalescença onde o poeta, fazendo uso de uma prótese de madeira, retorna ao convívio familiar na Bahia.

Sua condição de saúde era frágil pelo avanço da doença que se constituiu no grande mal do século 19, cujo nome era outro, tísica.

Foi aos poucos definhando, menos sua inspiração motivada por um novo amor, embora não correspondido pela atriz e cantora lírica italiana, Agnesi Trinci Murri.

A última aparição de Castro Alves, se deu em  março de 1871, quando diante do público declarou seu amor por Agnesi; “Teus olhos são negros, negros, como as noites sem luar... São ardentes, são profundos, como o negrume do mar. Sobre o barco dos amores, da vida boiando à flor, douram teus olhos a fronte do gondoleiro do amor...”

A cantora responde com a interpretação de trechos da obra O Guarani, de Carlos Gomes. Poucos meses depois, Castro Alves se despediria deste mundo, em 6 de julho de 1871, com apenas 24 anos.

Respeitado e amado pela sensibilidade, sua poesia ficou para sempre e atravessará séculos e séculos.

Castro Alves segue sendo lembrado no país todo, são poucas as cidades que não deram o nome de Castro Alves a uma de suas ruas ou mesmo avenidas. Confira alguns exemplos: