sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

Você já se imaginou dentro de um helicóptero no meio de um nevoeiro? Isto faz parte da rotina de um repórter aéreo

Boa parte dos motoristas, vez por outra, enfrenta neblina pelo caminho, especialmente nas estradas.

Imagine agora ter que encarar a neblina voando em um helicóptero? Precisei enfrentar essa situação inúmeras vezes nos meus tempos de repórter aéreo.

 

São Paulo é uma cidade onde o clima se modifica rapidamente. Às 7 da manhã vem a neblina, depois às 10 horas aparece um sol radiante.

 

No Sistema Anchieta - Imigrantes, costumeiramente acontecem nevoeiros. Sol na cidade e depois tempo fechado na serra e interligação.

Em várias ocasiões com o helicóptero na hora da decolagem avistei céu claro e visibilidade satisfatória. Depois, de repente, tudo fecha.

Tem hora que o piloto acaba ingressando no meio das nuvens e nós ficamos preocupados, mas eles não se perdem, se orientam pela bússola ou na conversa com outros pilotos pela fonia.

Quando era preciso voar em dias de nevoeiros esparsos, voltava minha concentração ainda mais para o trânsito. Olhava para baixo e deixava que o piloto, escolhesse os caminhos.

 

 

Mas houve uma vez em que o nevoeiro nos abraçou por completo. Perdemos a visibilidade totalmente. Não se enxergava um palmo à nossa frente, nem para baixo e nem para os lados.

O comandante que estava comigo começou subir na vertical para ganhar altura e sair acima do nevoeiro.

Subiu, subiu até que o sol apareceu sobre um céu azul lindíssimo. A cidade lá embaixo seguia coberta pela neblina e nós ficamos voando acima das nuvens.

 

 

De acordo com a meteorologista Joselia Pegorin, da Climatempo, que durante anos prestou serviço para a Rádio Eldorado, nevoeiro e neblina são essencialmente a mesma coisa.

“O termo difere a visibilidade, na neblina se consegue ver além de um quilômetro, no nevoeiro a distância pode se tornar bem menor”.

Para quem viaja de avião não há nenhum empecilho nessas condições, porque eles são pressurizados e conseguem voar bem acima das nuvens.

Além do que, se houver nevoeiro na hora do pouso, a descida acontece com a ajuda de instrumentos.

O Aeroporto de Congonhas utiliza o sistema ILS I (Instrument Landing System), que permite ao comandante a aproximação exata da pista mesmo que só se consiga enxergá-la nos momentos finais antes de tocar o solo.

Em Guarulhos onde os nevoeiros costumam ser mais frequentes, pela proximidade da Serra da Cantareira, a aproximação é feita em ILS CAT III Alpha, considerado o sistema de pouso mais seguro e avançado do mundo.

Os nossos helicópteros nem dispunham desses equipamentos até porque nossa finalidade era outra, observar o trânsito e nada mais além disso. 

 

 

Repórter aéreo voa sempre com o rádio ligado e fica escutando a emissora onde trabalha para, na hora que for chamado, entrar no ar com o relato do que está vendo lá entre os automóveis.

Aquela vez, cercado por completo pela neblina e depois sem ter como ver o que acontecia lá embaixo, fui obrigado a improvisar, informando aquilo que tinha visto antes de tudo fechar.

 

 

Naquele dia em que passamos a voar acima das nuvens a única coisa que deu para ver foi a ponta das torres transmissoras de televisão localizadas na Avenida Paulista.


 

O tempo de voo ia passando e diante daquela situação comecei a ficar preocupado com a possibilidade do combustível acabar sem que o nevoeiro se dissipasse.

Ficava eu olhando para o ponteiro do combustível e o piloto não me dizia nada. De repente surgiu uma abertura entre as nuvens e foi possível ver abaixo de nós o prédio do Estadão, na Marginal do Tietê.

 

 


Ufa! Foi como estar perdido e de repente encontrar o caminho de casa.  

O comandante baixou a altura, ingressou na brecha surgida e pudemos seguir para o Campo de Marte sãos e salvos.

Depois, na emissora, contei ao pessoal o que havia acontecido.

Ouvi da locutora Rose de Oliveira, o seguinte comentário:

“Vou colocar um apelido em você, de agora em diante vou te chamar de Geraldo Nuvens”.

sábado, 5 de dezembro de 2020

Complexo Esportivo do Ibirapuera está a venda. Quem quer comprar?

“Ibirapuera Complex, a maior e mais moderna arena multiuso da América Latina.”

A frase, que é quase um slogan, dá início ao vídeo postado no You Tube pelo governo paulista, para "vender", o Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães no Ibirapuera.

Inaugurado em 25 de janeiro de 1957, o conjunto reúne em um mesmo terreno, o Estádio Ícaro de Castro Melo, o Conjunto de Piscinas Caio Pompeu de Toledo e o Ginásio de Esportes Geraldo José Almeida.

O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat) anunciou, em sua última reunião, que não existe nada naquele complexo esportivo que mereça ser preservado.

Tal decisão abriu a oportunidade para quem adquirir o terreno de promover alterações naquilo que lá existe.

Consta do projeto a construção de um hotel cinco estrelas com heliponto e até de um shopping center.

A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou o projeto, na terça-feira, 1° de dezembro de 2020, que autoriza a concessão para a iniciativa privada por um prazo de 35 anos, com investimento mínimo de R$ 220 milhões.

O assunto ainda irá passar pela Câmara Municipal de São Paulo, porque o terreno foi doado pela prefeitura, em 1954.

Entidades em defesa do esporte olímpico se mostraram contrárias à proposta, assim como um grupo de urbanistas da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo – FAU/USP.

Alegam que a privatização poderá interferir na preparação de novos atletas, além de afastar o público que recebe atividades recreativas gratuitamente. 

Haverá impactos no trânsito, porque a construção de um shopping center modifica tudo o que está à sua volta.


Em outras épocas a administração pública investia na elaboração de projetos de fundo social ligados ao esporte.

A queda nesses investimentos, certamente, está ligada à diminuição na quantidade de cursos e eventos, antes ali realizados.

Além das competições esportivas, inúmeros espetáculos culturais e artísticos aconteciam no Ginásio do Ibirapuera. 

Muita gente ainda se lembra dos shows de patinação do "Holliday On Ice", das apresentações de Roberto Carlos e das bandas de rock no Ginásio do Ibirapuera, como Genesis, Jethro Tull e Deep Purple, entre outras.

Em 1998, no Estádio Ícaro de Castro Melo, os Rolling Stones fizeram uma exibição memorável ao lado de Bob Dylan.

 Na atualidade outras arenas estão recebendo esses grandes shows e, mais recentemente, - por causa da pandemia - torneios esportivos foram suspensos ou disputados sem a presença do público.

Quando não entra dinheiro, também os governantes perdem o interesse, entendem eles que não há como destinar dotação orçamentária para bancar atividades que dão prejuízo e o fator social acaba esquecido.


Sobre os cursos mantidos gratuitamente nas dependências do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, temos uma história para contar.

Em décadas passadas, nos matriculamos em um curso de natação para pessoas com deficiência.

Uma das piscinas do Ibirapuera foi adaptada para essas aulas que proporcionaram recreação através do esporte a muitos deficientes físicos.

O curso possibilitou a todos nós, a oportunidade de aprender a nadar, fortalecendo nossa capacidade aeróbica e a autoestima em todos.


Formamos até um time de polo aquático e, por tudo isso, quem participou daquelas atividades jamais se esquecerá, tamanha a felicidade proporcionada.

Experiências deste tipo servem agora de exemplo para mostrar que o esporte aproxima as pessoas independente da raça, cor, religião ou gênero.

Para aquele curso foi designada uma professora especialista no ensino da natação para pessoas com mobilidade reduzida.

Junto com ela trabalhavam assistentes, estagiários em educação física e até uma equipe que nos ajudava a entrar e a sair da piscina.

No grupo havia cadeirantes e os que se locomovem com a ajuda de órteses, próteses, muletas ou mesmo bengalas.

Tais equipamentos não podem entrar na água então, o auxílio de alguém na entrada e na saída da piscina, se torna um fator essencial.

Na ocasião foi criado um vestiário adaptado às nossas condições e tudo funcionava sem nenhum luxo, tudo simples e funcional.

Mesmo com poucas verbas havia criatividade em tudo aquilo que se fazia.


O curso transcorreu normalmente até que um novo governo, que não é o atual, modificou a diretoria do Complexo Constâncio Vaz Guimarães.

Com uma nova filosofia de trabalho que buscava mostrar austeridade com o dinheiro público, nossa professora especialista não teve seu contrato renovado, o mesmo acontecendo com a equipe de apoio.

Todas ocupavam cargos comissionados e, na burocracia da máquina pública, o contrato a título precário pode ser extinto em qualquer momento.

Para a sorte daquele grupo o curso prosseguiu porque havia entre os funcionários públicos concursados uma professora treinada pela antecessora.

Essa profissional deu conta do recado, assumiu muito bem o comando das aulas, mesmo sem a equipe de apoio que não foi reposta.

Todos os paraplégicos ficaram na dependência da boa vontade de outros funcionários que, quando chamados, deixavam por alguns minutos suas atividades para nos ajudar a entrar e sair da piscina.

As aulas prosseguiram mais algum tempo até surgir um novo problema. A piscina aquecida passou a esfriar por causa de um vazamento.

Fomos informados que aulas seriam suspensas para a reforma, mas para isso seria necessária a abertura de uma licitação pública.

A licitação incluiu a piscina olímpica, a céu aberto, que precisava também de reparos urgentes.


A foto aérea acima mostra a piscina olímpica completamente vazia, sinal da demora em se aprovar as reformas tão necessárias. 

Devido à longa espera o grupo de alunos paraplégicos se dispersou e aquele curso de natação acabou sendo extinto.


A foto da carteirinha prova nossa frequência como aluno do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães.

Sempre e em todo lugar, cabe ao Estado, o papel de abrir portas para o desenvolvimento pessoal e social de cada cidadão ou cidadã.

Para isso existem as escolas públicas e outros mecanismos como é o caso do Complexo Desportivo Constâncio Vaz Guimarães, criado para atender qualquer cidadão que queira se desenvolver nas práticas esportivas.

Deixar de destinar verbas para o funcionamento de órgãos tão importantes, é simplesmente lamentável.

A população agora ficará na dependência daqueles que adquirirem o complexo desportivo podendo fazer dele aquilo que quiserem. 

Constâncio Ricardo Vaz Guimarães, nasceu na cidade de Santos, em 1915, e se tornou atleta do clube Saldanha da Gama. 

Ao término da carreira esportiva se dedicou à pesquisa e desenvolvimento do esporte em todo o Brasil.

A notícia de seu falecimento em São Paulo, em abril de 1961, repercutiu no país todo e o governo paulista de então, em justa homenagem, deu seu nome ao maior conjunto poliesportivo construído no Ibirapuera.

Um santuário esportivo dessa proporção e grandeza mereceria um olhar mais afetuoso de nossas autoridades e da sociedade que no fundo parece concordar com decisões que prejudicam sempre o lado mais fraco.

Assista à campanha iniciada pelo governo João Doria para “vender” o Ibirapuera. Confira o vídeo abaixo ou acesse:

https://www.youtube.com/watch?v=pfE6tkOg038&feature=emb_logo