sexta-feira, 29 de julho de 2022

Descubra como era a São Paulo de 1822 no Dia do Grito e os acontecimentos em torno da Independência

Imagine São Paulo em 1822, cidadezinha com população de 15 mil habitantes, muito parecida à São Luiz do Paraitinga que temos hoje. 

Seu território em nada lembrava a metrópole atual, o núcleo urbano ficava concentrado unicamente nos entornos da região da Sé confinada entre os rios Anhangabaú e Tamanduateí.

A pintura de François-René Moureaux, de 1844, expressa de modo mais próximo ao real como foi a entrada de Dom Pedro em São Paulo, depois de proclamar a independência às margens do Ipiranga.

Havia temores que uma guerra civil separasse a Província de São Paulo do restante do Brasil e o príncipe regente decidira vir do Rio de Janeiro até a capital dos paulistas na tentativa de acalmar os ânimos. Ao chegar preferiu antes hospedar-se na Penha.

Como não havia prédios, quem estivesse em frente à igreja, conseguia ver o burgo paulistano e Dom Pedro pediu ao secretário particular, Francisco Gomes da Silva, o Chalaça, que viesse antes a São Paulo para sentir como estavam os ânimos.

Em 9 de janeiro de 1822, Dom Pedro, anunciou que ficaria no Brasil após ler uma carta mais parecida a uma intimação que José Bonifácio, seu ministro de de confiança, enviou e o colocou a par da situação.

“... A revolução já está preparada para o dia de sua partida. Ministro fiel que arrisquei tudo por minha Pátria e pelo meu príncipe, servo obedientíssimo do Senhor D. João VI, devo dizer que as cortes de Lisboa o têm na mais detestável coação. Eu, como ministro, aconselho a Vossa Alteza que fique e faça do Brasil um reino feliz, separado de Portugal, que é hoje escravo dessas cortes despóticas..."

Foi este documento que ocasionou o Dia do Fico.

Embora português, Dom Pedro se viu obrigado a proclamar a independência do Brasil, antes que algum outro fizesse, ele só não sabia em qual momento e hora, teria condições para anunciar essa decisão.

Informado que os ânimos estavam serenos, o jovem príncipe juntou uma comitiva formada por homens fiéis a ele e seguiu de São Paulo para a cidade de Santos.

Seu objetivo foi verificar como estavam as fortalezas que guardavam o porto caso houvesse uma reação por parte de Portugal.

Segundo registros do historiador santista, Francisco Martins dos Santos, “...As ruas pelas quais o cortejo passou estavam juncadas de flores e folhagens, apinhadas de povo. Das sacadas pendiam colchas de seda e senhoras e moças atiravam rosas e outras flores...”

Dom Pedro se hospedou no Convento dos Jesuítas, onde hoje fica a Alfândega de Santos. Antes, visitou a Fortaleza da Barra e o Forte Itapema, mostrados acima na pintura de Benedito Calixto. Depois, atendeu o convite para jantar na casa da família de José Bonifácio.

A viagem de retorno a São Paulo teve início às 5 horas da manhã, seguiu pela Calçada do Lorena, cujo trajeto íngreme de subida da serra impedia o acesso de cavalos, por isso o caminho foi feito sobre o dorso de mulas.

O mensageiro da coroa Paulo Bregaro, que havia partido do Rio de Janeiro para a entrega das cartas vindas de Portugal, além das assinadas por Dona Leopoldina e José Bonifácio, passou por São Paulo e seguiu com destino a Santos, mas encontrou com a comitiva que voltava.

Era a tarde do dia 7 de setembro de 1822, um sábado e o grupo às margens do Riacho Ipiranga, se preparava para a troca das montarias, substituindo assim, as mulas pelos cavalos, conforme o biógrafo Paulo Rezzutti.

Uma das cartas entregue a Dom Pedro, dava conta da assinatura da independência, decretada em 2 de setembro de 1822, por Dona Leopoldina, na condição de princesa regente do Brasil.

A futura imperatriz usou suas atribuições de chefe interina do governo, para assinar o documento que informava Portugal do resultado da reunião do Conselho de Estado que decidiu pelo rompimento dos laços que uniam os brasileiros ao reino de Lisboa.

O povo ainda não tinha conhecimento dessa decisão, ainda se acreditava no retorno de D. Pedro à sua terra natal, mas diante do que estava nas cartas somado à postura irredutível do governo português de rebaixar o país à condição de colônia, nada mais restava ao príncipe, senão anunciar ali mesmo que estava proclamada a Independência do Brasil.

Dom Pedro conclamou os acompanhantes e fez um breve discurso em voz alta finalizado com o célebre grito que entrou para a história: “Independência ou Morte!”

A pintura de Pedro Américo, concluída 50 anos depois, enobreceu e deu cores românticas ao ato. Em qualquer outro país fariam o mesmo.

Como a cidade de São Paulo ainda era pequena, a informação que o príncipe regente chegaria no final daquela tarde fez com que as pessoas saíssem às janelas e outras permanecessem nas ruas para acompanhar a entrada solene.

Dom Pedro e sua comitiva subiram a Ladeira do Carmo, tendo sido o príncipe recepcionado pelo bispo Dom Mateus de Abreu Pereira, o primeiro a ouvir de viva voz na cidade, a notícia da independência.

O futuro monarca seguiu em meio à festa popular para o Palácio do Governo, localizado onde está reconstruída a igreja do Pátio do Colégio.

À noite houve uma recepção festiva no Teatro da Ópera quando então pôde sua majestade ficar ao lado de Domitila de Castro que havia conhecido em sua primeira passagem por São Paulo, antes de seguir a Santos.

Aquela que seria a Marquesa de Santos, se tornou depois sua amante e confidente.


Ainda em São Paulo, no dia 9 de setembro, nomeou uma junta governativa para a Província de São Paulo, composta pelo bispo diocesano D. Mateus de Abreu Pereira, o ouvidor da comarca, Dr. José Corrêa Pacheco e Silva e o marechal Cândido Xavier de Almeida e Sousa.

Às 5 horas do dia 10 de setembro de 1822, deixou a capital paulista, partindo para o Rio de Janeiro, aonde chegaria em tempo recorde de cinco dias, apesar dos temporais pelo caminho.

Foi Dom Pedro I aclamado imperador, no dia em que completou 24 anos de idade, 12 de outubro de 1822, solenemente coroado e consagrado Defensor Perpétuo do Brasil.

Começava assim o processo de consolidação de nossa independência que segue em andamento até os dias atuais. 

Fontes:

Alves, Odair Rodrigues/Os homens que governaram São Paulo/Nobel/São Paulo/1986

Bittencourt, Vera Lúcia Nagib/De Alteza Real a Imperador/PDF/Universidade de São Paulo/2006

De Assunção, Paulo/São Paulo Imperial: a Cidade em Transformação/Editora Arke/São Paulo/2004

Rezzutti, Paulo/Independência: a história não contada: A construção do Brasil: 1500-1825/LeYa Brasil Editora/São Paulo/2022

Sérgio Ribeiro, Antonio/São Paulo - berço da Independência do Brasil/Portal Alesp/2021

Caminho feito por D. Pedro I/Priscila Mengue/O Estado de S. Paulo/27/07/2022 pg.10 A

Imagens: Google/Wikipédia

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Incêndio na região da 25 de Março atinge parte da história

A Prefeitura de São Paulo deu início aos preparativos para demolição do prédio que pegou fogo na região da Rua 25 de Março, no dia 10 de julho de 2022.

O incêndio que durou mais de 60 horas abalou as estruturas do edifício e ficou definido que não haverá implosão.

Operários serão elevados por guindastes para destruir a estrutura de cima para baixo e a demolição total deve durar até seis meses.


O fogo esparramou-se para outros quatro endereços localizados na região da Rua 25 de Março.

A Igreja Ortodoxa Antioquina da Anunciação à Nossa Senhora, que faz parte da história da região, foi atingida.

O templo considerado o mais antigo desta religião no Brasil, foi inaugurado em 1904.

Ali se reúnem para as celebrações, remanescentes dos imigrantes sírio-libaneses, netos e bisnetos de origem cristã.


A artista plástica Cristiane Carbone registrou essa igreja em uma de suas pinturas que ajudam a contar um pouco da história da cidade e isto pode colaborar, futuramente, na restituição da fachada original.

Uma das ruas paulistanas mais conhecidas em todo o Brasil, é a 25 de Março, graças ao comércio popular de tecidos, roupas de cama, mesa e banho, além dos artigos de bazar e papelaria.

Fazem parte da vizinhança ruas como a Cavalheiro Basílio Jaffet, Comendador Abdo Schahim e a Ladeira Porto Geral, cujo nome se deve a um porto de areia existente no passado, nas margens do Tamanduateí que por ali passava.

O pequeno porto servia ao desembarque das mercadorias vindas de Santos, trazidas por pequenas embarcações.

Bastante sinuoso em seu traçado original, o Tamanduateí também era chamado de Rio das Sete Voltas, devido ao emaranhado de curvas na região da Várzea do Carmo, parte que hoje se chama Glicério.


Após sua retificação completa, o Tamanduateí passou a ter cara de um riacho, como mostra a pintura de 1894, assinada por Antônio Ferrigno.

A Rua 25 de Março ganhou este nome por uma homenagem da prefeitura à data de promulgação da nossa primeira Carta Magna, assinada por Dom Pedro I, em 1824.

Mas quem retratou a região de forma exuberante, foi Benedito Calixto no quadro ‘Enchente na Várzea do Carmo’, de 1892.

Clique sobre a pintura para ampliá-la em seu celular.

Esta paisagem foi registrada dois anos antes da pintura de Antônio Ferrigno ser desenhada e nela se destaca a visão exuberante que se tinha do Rio Tamanduateí.

O Pátio do Colégio nesse tempo servia como mirante. Dele e da Rua Boa Vista, ainda é possível ver a baixada onde está agora o Parque Dom Pedro II e uma parte do Brás, naquele tempo repleto de chácaras, casarios e algumas das primeiras chaminés ao fundo.

Na pintura se observa à esquerda, o antigo Mercado dos Caipiras, substituído anos depois pelo atual Mercado Municipal, inaugurado em 1933.

Uma fotografia já do século 20 mostra o Mercado dos Caipiras decadente e quase vazio, sem a presença do Tamanduateí nas proximidades. A retificação do rio levou anos para ser concluída.

Quanto à situação atual, um véu deve ser colocado no alto do prédio incendiado para impedir que os escombros da demolição se desloquem e venham cair sobre outros edifícios ou até mesmo transeuntes.

A implosão, que seria um processo mais rápido, foi descartada por causa de possíveis abalos nas edificações vizinhas.

O prédio atingido pelo fogo tinha 79 salas comerciais onde funcionavam lojas, escritórios e depósitos. Os prejuízos ainda estão sendo calculados.


As fotos da noite do incêndio foram tiradas por um gari que trabalha na região e depois compartilhadas com Devanir Amâncio, nosso amigo e colaborador.



Fonte: O Estado de S. Paulo - Gonçalo Junior

 

 

quarta-feira, 13 de julho de 2022

Quase tudo pronto para a reabertura do Museu do Ipiranga

Para muitas pessoas a palavra museu ainda está associada a um lugar chato e destinado a guardar coisas antigas.

Este conceito tende a mudar a partir da reabertura do Museu do Ipiranga, prevista para acontecer em 7 de setembro de 2022, data do bicentenário da Independência do Brasil.   

A restauração completa do prédio histórico, inaugurado em 1895, foi concluída no mês de fevereiro deste ano.

Falta ainda colocar em ordem os ambientes internos que incluem o saguão, as salas de exposições e os corredores, mas tudo isso deve ficar pronto dentro do prazo previsto.

Pelo lado de fora, os testes para a reativação dos chafarizes junto aos jardins franceses, a cargo da prefeitura, estão em andamento.

A grande novidade é que o público poderá interagir e caminhar entre os jatos d’água dos chafarizes, sem se molhar.

Dentro do museu para os visitantes, a forma de se contar a história do Brasil foi revista e modernizada pela colocação de imagens e textos digitais em multimídia.

Por outro lado, peças tradicionais do acervo, como a escultura em mármore do bandeirante Antônio Raposo Tavares serão mantidas, embora o contexto histórico dessas obras tenha sido modificado.

Os bandeirantes não estão sendo encarados como colonizadores, mas agora por alguns historiadores, como escravizadores de índios.

Se trata de um assunto ainda polêmico e como a escultura do artista plástico Luigi Brizzolara, integra o chamado eixo monumental do museu, que está tombado e não pode ser mexido, a estátua continuará onde está.

Ao todo são 54 pinturas e 9 esculturas entre as quais a tela Independência ou Morte, de Pedro Américo, que permaneceu dentro do museu durante a reforma e lá mesmo foi restaurada.


Ao lado de cada uma dessas obras de arte teremos explicações relativas ao contexto histórico da época que levou à colocação delas em uma ala tão importante do acervo.

O Museu do Ipiranga foi fechado em 2013, após uma ampliação assustadora na quantidade de cupins e rachaduras nos pilares e outras estruturas do centenário edifício.


Os primeiros problemas foram relatados décadas atrás em uma reportagem que apresentei na Rádio Eldorado, dentro do programa São Paulo de Todos os Tempos, gravado nas dependências do Museu Paulista, em 1997.

Na ocasião entrevistamos o então diretor da instituição, o professor José Sebastião Witter de saudosa memória.

A reforma agora concluída, acreditamos, coloca um ponto final aos problemas estruturais, comentados pelo então diretor.

O local foi adaptado dentro dos critérios arquitetônicos do “desenho universal”, seguidos pelos museus e demais edificações mundo afora.

Uma nova entrada foi construída para facilitar a acessibilidade de todas as pessoas, além de elevadores, escadas rolantes, auditório, sala de café e leituras.

Para quem quiser ouvir a reportagem gravada feita nas dependências do Museu do Ipiranga, em 1997, seguem os links de acesso ao Anchor e Spotify.

Basta clicar:

Um passeio pelo Museu do Ipiranga #133 de São Paulo de Todos os Tempos (anchor.fm)


Um passeio pelo Museu do Ipiranga #133 - São Paulo de Todos os Tempos | Podcast no Spotify

 


 

Fontes: Jornal da USP e Folha de S. Paulo

sábado, 2 de julho de 2022

Entenda como foi a Revolução Constitucionalista de 1932

Para entender a Revolução Constitucionalista de 1932 é preciso retroceder à Proclamação da República, em 1889.

O fim da Monarquia não suscitou na implantação da plena democracia, fez sim ascender ao poder os grandes fazendeiros, empresários e comerciantes ligados ao café.

São Paulo, até então uma província interiorana afastada dos negócios e dos interesses da capital federal se viu transformada na “locomotiva da nação”.


Todo o café produzido era exportado e o que ficava da safra excedente era comprado pelo governo e depois queimado.

Assim, os preços no exterior se mantinham estáveis e, no mercado interno, o mesmo se fazia em relação ao leite produzido nas fazendas de Minas Gerais.

Tal procedimento garantia a riqueza dos fazendeiros independente do que acontecesse no plantio ou na colheita.

Em razão disso passou a haver alternância do poder somente entre governantes paulistas e mineiros.

Para se ter uma ideia de como era o Brasil nesses tempos, a participação popular na política se limitava a apenas 5% da população com direito ao voto.


Quase não havia para a classe média oportunidades de emprego, deste modo o que se almejava na vida era seguir uma carreira tradicional de comerciante, padre ou militar.

Isto fez surgir uma quantidade enorme de tenentes, ou seja, oficiais de menor patente que com o passar do tempo ficou em número maior que o de oficiais graduados como coronéis e generais.

Esta situação conflituosa deu origem a um movimento político iniciado dentro dos quartéis chamado tenentismo.

Medidas que desagradavam os tenentes, davam motivo para insurreições como foi o caso da Tomada do Forte de Copacabana, em 1922 e a Revolução de 1924, em São Paulo.

A quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929, afetou a economia brasileira, os preços do café despencaram no mercado externo e isto fez aumentar internamente o desemprego e a fome.

Em consequência, os fazendeiros de São Paulo e Minas se desentenderam e o então presidente Washington Luiz, decidiu quebrar a regra de alternância e buscou eleger um outro paulista para a presidência da República, Júlio Prestes.

Os tenentes que já haviam tentado destituir a República do Café com Leite, nos levantes de 1922 e 1924, se revoltaram contra o resultado das eleições.

Diferente das outras vezes, a mobilização dos tenentes aconteceu em todos os quartéis do país e o presidente Washington Luiz foi deposto e seu sucessor, Júlio Prestes, nem chegou a assumir.

Os tenentes unidos aos militares de maior patente decidiram conduzir ao poder Getúlio Vargas, que havia sido derrotado nas urnas por Júlio Prestes, em uma eleição considerada por eles fraudulenta.

Este desenrolar entrou para a história com o nome: Revolução de 1930.

Em São Paulo, o PD - Partido Democrático – surgido de uma dissidência do PRP – Partido Republicano Paulista, de início apoiou Getúlio Vargas.

Este, desfila em carro aberto pela capital paulista, antes de prosseguir sua viagem de trem na direção do Rio de Janeiro onde tomaria posse.

Se acreditava que Getúlio Vargas fosse nomear para o governo paulista algum integrante do Partido Democrático, mas essa expectativa não se concretizou.

Em vez de governadores, Getúlio Vargas nomeou para os estados, tenentes-interventores e para São Paulo, escolheu João Alberto Lins de Barros, um pernambucano linha dura e fiel cumpridor de ordens.

Tal atitude irritou os liberais paulistas que deixaram de apoiar Getúlio.

João Alberto para contrapor e provocar a população, colocou seus colegas tenentes vindos de outros estados em cargos importantes do funcionalismo e estes passaram a abusar do poder.

Os nomeados de João Alberto compareciam a lugares de luxo como os restaurantes, por exemplo, comiam e depois penduravam a conta em nome da Revolução de 1930.

No Distrito Federa, o "governo provisório", seguia baixando decretos e mantendo fechadas as casas legislativas, sem manifestar a intensão de transferir o poder de forma democrática e sem sequer cogitar a possibilidade de elaboração de uma nova Carta Magna.

Em 1º. de janeiro de 1931, uma quinta-feira, o jornal O Estado de S. Paulo publicou um editorial no qual propunha ao país a realização de uma assembleia constituinte e fazia lembrar que já era hora de se retomar a normalidade democrática.

Getúlio responde ao jornal através de um porta-voz de sua confiança, Juarez Távora e diz ser ainda cedo porque, “antigos republicanos poderiam reacender a manipulação das eleições”.

Ao retrucar o jornal, o porta-voz acabou unindo os opositores de São Paulo contra os tenentes e contra Getúlio.

Os estudantes da Faculdade de Direito passaram a sair às ruas promovendo comícios e conclamando o povo a pedir uma nova constituição.

João Alberto se contrapõe e dá início à repressão, tendo o cuidado antes de retirar as armas dos quartéis da Força Pública de São Paulo para assim evitar uma possível reação.

As propostas constitucionalistas apresentadas por São Paulo ganham adeptos no Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro.

O Partido Democrático rompe com Getúlio e cria uma frente única propondo um governador paulista.

Em 25 de janeiro de 1932 acontece um grande comício na Praça da Sé e em várias partes do país surgem descontentes que apontam estarem os tenentes mandando mais que os generais.

No Rio Grande do Sul e em São Paulo se iniciam mobilizações para que Getúlio seja afastado do poder. Este, pressionado, destitui João Alberto.

Depois de idas e vindas, em 7 de março de 1932, Getúlio Vargas indica um paulista como interventor: Pedro de Toledo.

Em São Paulo, os generais Isidoro Dias Lopes e Euclides de Figueiredo articulam com o general Bertholdo Klinger, do Mato Grosso, um plano para destituir Getúlio Vargas.

No sul do país, o general Flores da Cunha, antigo aliado getulista, se diz revoltado e promete enviar tropas em apoio a São Paulo, assim como o governo de Minas Gerais.

Essas informações chegam até o gabinete presidencial que passa a prometer eleições e uma assembleia constituinte para o ano seguinte, mas já era tarde.

Em 22 de maio, estudantes paulistas se municiam de armas e seguem até a Praça da República com o objetivo de invadir a sede política dos tenentes.



Há um tiroteio e a batalha termina na madrugada do dia 23 de maio com vários corpos de estudantes estendidos nas calçadas entre a Praça da República e a Rua Barão de Itapetininga.

Entre os manifestantes mortos aparecem os nomes Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo, um deles de apenas 14 anos, fato causador da comoção popular e revolta contra o ditador.

No dia seguinte é fundado o movimento MMDC, com as iniciais dos quatro jovens, cuja missão seria a de conclamar as pessoas para uma guerra pela destituição de Getúlio e criação de uma assembleia nacional constituinte.

A data para o ataque fica marcada para o dia 14 de julho, a mesma da revolução francesa, mas Getúlio ao ser informado, destitui do cargo, o general Klinger, comandante militar no Mato Grosso.

Isidoro Dias Lopes sugere então que os paulistas se antecipem ao ataque, porque se temia não haver tempo para os gaúchos e mineiros chegarem antes da data acertada e a tese de Isidoro acaba prevalecendo.

“Os jornais não falavam em revolução, anunciavam que haveria uma guerra e passam a convocar os jovens paulistas para o alistamento e adesão a um exército paulista formado por São Paulo”, explica o historiador Hernâni Donato, em sua obra, “Breve História da Revolução Constitucionalista”.

"O clamor popular é intenso e até as jovens solteiras conclamam à luta seus noivos ou namorados: Houve quem dissesse a quem não quisesse vestir a farda, que então vestisse uma saia”. Outra fase: “Homem que é homem vai à guerra", escreve Hernâni Donato em seu livro.

Mais de 200 mil paulistas se inscreveram nas frentes de batalha, muitos jamais haviam pegado em armas, mas foram à luta com coragem e disposição. “Todos os que lutaram pela causa constitucionalista, em 1932, devem ser considerados heróis”, ressalta o historiador em suas páginas.


Cerca de 100 mil mulheres residentes na capital e em outras cidades, passam a oferecer serviços às organizações de apoio para costurar os uniformes dos voluntários e a confecção de agasalhos.

O inverno de 1932 foi dos mais rigorosos as mulheres voluntárias confeccionaram mais de 440 mil fardas e várias delas se prestaram aos serviços de enfermagem para o atendimento dos combatentes feridos.

Ninguém cobrou pelos serviços, as costureiras se revezaram em turnos diurnos e noturnos à frente de 800 máquinas de costura.

"Tal disposição não pode ser esquecida, as mulheres paulistas se portaram como verdadeiras heroínas", destaca o escritor.

A Associação Comercial se mobilizou na manutenção dos salários às famílias dos voluntários em guerra. Até menores de idade foram recrutados para serviços de “office-boy” dentro da cidade.

Na madrugada de 9 de julho, as tropas comandadas pelo general Euclides Figueiredo seguiram rumo à divisa entre os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. Lá, bloquearam o túnel ferroviário, impedindo a passagem do trem que ligava o distrito federal com a capital paulista.

Ali parados, ficaram esperando o reforço das tropas que acreditavam vir em apoio do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais.

Em revide, Getúlio determina a interdição do Porto de Santos e impede a chegada ou a saída de qualquer tipo de embarcação ou mercadoria.

Ao mesmo tempo, o ditador passa a negociar no sentido de demover os comandantes militares dos outros estados da ideia de se associar ao movimento constitucionalista de São Paulo.

No dia seguinte, por aclamação, Pedro de Toledo é nomeado governador de São Paulo, enquanto do outro lado, o poder central passa a divulgar a notícia inverídica que a luta dos paulistas era separatista.


Já o noticiário de guerra dava conta aos jornais de São Paulo que a cada dia as tropas avançavam na direção do Rio de Janeiro, mas Hernâni Donato, em uma entrevista nos disse:
“As notícias eram estranhas porque citavam avanços dos soldados, mas ou se andava em círculos ou se recuava”.

O professor Donato descreve que os jornais um dia informavam que os soldados paulistas estavam no município de Lavrinhas, no outro dia em Piquete, mas não havia um avanço efetivo.

“A verdade, soube-se depois, é que a principal frente de batalha ficou parada na divisa com o Rio de Janeiro”, assim conclui o historiador.

Nos dias da revolução, a Rádio Record se tornou a porta-voz dos paulistas  com a  narração das notícias vindas do front nas vozes de César Ladeira e Nicolau Tuma se revezando nos microfones.

Mensagens de apoio escritas pelo poeta Guilherme de Almeida passaram a ser lidas tendo como fundo musical a marcha Paris Belfort.

A escolha da música se deu de forma aleatória pelo técnico de som, mas se tornou o tema que faz lembrar a Revolução Constitucionalista.

As tropas provenientes de Minas Gerais vieram como se esperava, mas ao contrário do previsto, chegaram atirando nos paulistas pegando-os pelas costas e de surpresa.

O mesmo aconteceu em Itapeva e Buri, ao sul do estado, diante das forças provenientes do Rio Grande do Sul.


Houve ataques também em outras localidades do interior paulista pelas tropas provenientes do Mato Grosso e aviões bombardearam o Campo de Marte para impedir a saída da pequena aviação paulista pertencente à Força Pública.

Diante destes acontecimentos, a população começou a ficar temerosa com o risco da cidade de São Paulo ser bombardeada como já havia acontecido durante a Revolução de 1924.

Ao final, as tropas federais ao entrarem por São José do Barreiro, atacaram as trincheiras paulistas e tomaram para si o controle do túnel ferroviário.

Não havia mais o que fazer, São Paulo perdeu a guerra nas armas.

No dia 3 de outubro de 1932, uma segunda – feira, o Estadão publicou em primeira página os termos de um armistício que colocou fim à guerra. 

Ao lado, na primeira página do jornal, o governador Pedro de Toledo, publica uma mensagem onde explica: “Tudo o que e se pôde fazer foi feito, até uma moeda paulista foi emitida quando os recursos federais foram cortados...”

Uma campanha com valores em ouro de fato foi feita, para dar lastro ao novo dinheiro emitido durante a revolução: “Ouro para o bem de São Paulo”, se chamou o movimento.

 Após a revolução, o que sobrou do montante arrecadado se aplicou na construção de um prédio no centro da cidade, cujo formato lembra a bandeira paulista.

Todos os que comandaram a revolução foram exilados e só depois de longas tratativas, anistiados.

Como o ideal constitucionalista ultrapassou as fronteiras do estado de São Paulo, o país todo passou a exigir uma posição do governo a esse respeito.


Por isso é que se diz; São Paulo não venceu nas armas, mas ganhou graças à defesa dos ideais democráticos.

Isto é verdade, cerca de mil soldados morreram do lado paulista durante a Revolução de 1932 e desse total aproximado, somente 634 foram devidamente identificados estando seus nomes e suas biografias publicados no livro “Cruzes Paulistas – os que tombaram em 1932 pela glória de servir São Paulo”, cuja edição original é de 1936.


A publicação aconteceu como parte de uma campanha desenvolvida para a construção do monumento e do mausoléu hoje existentes no Ibirapuera.

Em 2014, graças ao empenho da Sociedade dos Veteranos de 32 e do incentivo do Centro de Memória Eleitoral do TRE-SP, a obra foi reimpressa pela Imprensa Oficial do Estado para lembrar a existência destes heróis às novas gerações.

No ano de 1934, o Brasil obteve uma constituição que assegurou pela primeira vez, preceitos democráticos que permaneceram garantidos pelas constituições que vieram depois como o direito ao voto secreto com dignidade e o direito de voto à mulher.


Para se entender ainda mais o sentido da Revolução dos Paulistas, é importante fazer lembrar que, até então, não se sabia no Brasil o amplo significado da palavra democracia, como demonstra o histórico levantado neste texto.

A defesa dos ideais democráticos deve ser encarada pelos mais jovens como uma luta permanente em defesa da transparência, cidadania e do estado de direito para todos.

São palavras atuais que fazem sentido também aos ideais do passado, daqueles que lutaram na Revolução Constitucionalista de 1932.

Sempre que surgirem na vida pública, decisões que não respeitem esses princípios, estarão sendo contrariadas as propostas daqueles que tombaram não só por São Paulo, mas pela Pátria.

Não podemos dar ouvidos aos golpistas, a democracia é, e será sempre fundamental.

Por tudo isso a melhor definição para o movimento constitucionalista continua sendo a do poeta Paulo Bomfim: “A trincheira de 32 foi a pia batismal da democracia em nossa terra”.