terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Em busca de uma brecha no meio das nuvens em plena véspera de Natal, em mais uma das aventuras deste repórter aéreo


Luís Negro. Este é seu nome de batismo, tipo de pessoa que costumamos chamar de gente fina. Ele continua sendo um hábil e experiente piloto de helicópteros. Certa vez ele foi simpático, generoso e prestativo. Até demais!

Sempre voava conosco nos finais de semana e nos feriados, como aquele de 24 de dezembro, véspera de Natal, em 1994.

Ansiedade é o que não falta nestes dias de correria para as compras e preparativos da ceia natalina, quando à noite fazemos a tradicional entrega de presentes em família.

Mas antes dos preparativos daquele havia o nosso plantão no Estação Férias da Rádio Eldorado com sobrevoo marcado para ter início às 7 da manhã.

O trânsito se mostrava intenso dentro da cidade de São Paulo desde as primeiras horas com lentidão na Avenida 23 de Maio sentido centro, reflexo do excesso de veículos na Rua Carlos de Souza Nazaré que dá acesso à região da Rua 25 de Março.

Helicópteros destinados à cobertura do trânsito voam apenas no visual. Ficar acima das nuvens nos dava um certo receio
A população paulistana tinha também acordado cedo naquela manhã, ou para fazer compras ou seguindo viagem pelas estradas na direção das praias ou das estâncias climáticas. Era, portanto, um dia festivo mas movimentado.

Como se tratava de uma data especial, a emissora disponibilizou para nós horas a mais de voo para o nosso trabalho, devidamente pagas pelos nossos patrocinadores.

A rodovia Fernão Dias ficou parada entre a capital paulista e Atibaia, sentido Minas. Depois de um rápido pouso para reabastecimento, fomos para lá.

Após avistarmos a estrada que liga São Paulo a Minas Gerais, recebemos de nossa redação o informe que o trecho serra da Via Anchieta estava congestionado na pista de subida por causa de um acidente entre dois caminhões.

Havia repórteres de nossa emissora monitorando o Sistema Anchieta-Imigrantes no centro de operações da antiga Dersa, mas não havia como eles se deslocarem naquele momento para o trecho serra da estrada de Santos.

Comentei com o Luís Negro sobre o acidente e ele na hora se prontificou a seguir para o litoral.

Eu não esperava por aquilo, achei que o combustível não daria pelos trajetos tradicionais e até aleguei que estávamos longe do lugar, mas ele disse que conhecia uma rota aérea que facilitaria nossa chegada até Bertioga rapidamente e de lá seguiríamos para Via Anchieta.

Ajustou procedimentos e frequências no helicóptero iniciando sua trajetória sentido baixada santista. Pensei comigo: “Eu deveria ter ficado calado”. O céu estava nublado abaixo de nós.

Ele então me disse: “Fique tranquilo, assim que aparecer algum buraquinho nas nuvens eu desço”. Buraquinho? E agora? Engoli seco.
Fiquei com um certo receio, mas não tive medo, sempre fui destemido. Se não fosse não teria aceito ser repórter aéreo. Para nossa sorte, deu tudo certo. Afinal, eu estava ao lado de um ótimo piloto.

Esta foi a visão aérea que tive da travessia Guarujá-Bertioga

Bem do alto, o comandante Luís Negro ultrapassou os limites da Serra do Mar e em pleno céu fomos baixando de altura gradativamente pela brecha encontrada por ele entre as nuvens.

Saímos perto da travessia por balsas sentido de Bertioga para o Guarujá, mas notei que ainda havia névoa, agora acima de nós cobrindo o céu do litoral. E para voltar a São Paulo, como faremos?

Pensei em meus compromissos, lembrei que também eu havia planejado fazer compras com a família no período da tarde. Os shoppings estariam lotados e Luís Negro, então pai de dois filhos deveria estar pensando o mesmo. Ele iria querer se arriscar. 

Prosseguimos o sobrevoo a bordo do nosso Robinson R-22 no sentido serra da Via Anchieta, quando avistamos dois guinchos já removendo os caminhões acidentados.

Pedi prioridade à rádio e entrei no ar narrando que a pista da Anchieta estava sendo liberada, alívio para aqueles que deixavam Santos no sentido São Paulo.

Naquele tempo só havia uma pista na Imigrantes no trecho serra e a mão de direção era invertida no sentido litoral nos dias de grande movimento. Os moradores de Santos só tinham a Anchieta como opção de subida.

A névoa foi dissipando e o sol se abriu diante de nós. Voltamos para o Campo de Marte por São Bernardo do Campo, Ipiranga e Avenida do Estado.

Tivemos um Feliz Natal em família e o nosso piloto também, mas as lembranças do comandante Luís Negro procurando uma brechinha nas nuvens permanecerá para sempre, agora entre risos e recordações.


Qualquer pessoa adoraria sobrevoar as praias a bordo de um helicóptero

Veja do alto o Guarujá, a nossa pérola do Atlântico


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