segunda-feira, 8 de junho de 2020

Manobras radicais e loopings entre as neuras de um piloto e seu repórter aéreo

Quando iniciei como repórter aéreo a preocupação dos controladores de voo era com a interferência dos helicópteros no trajeto dos aviões para o pouso no aeroporto de Congonhas.

Como sempre há pilotos mais cautelosos e outros menos, mas nunca vi nenhum deles querer colocar a vida em risco em manobras arriscadas.

O primeiro piloto com quem sobrevoei a cidade se chama Edgard Schaffer.

Ele é mais um entre os pioneiros na implantação da família Robinson de helicópteros no Brasil.

Schaffer ajudou trazer para nós o R-22 pelo final da década de 1980, período em que iniciei meus sobvrevoos.

Por ser uma aeronave de pequeno porte causou estranheza no início.

Há também, um certo preconceito por parte de alguns “entendidos” com esse tipo de aeronave, ainda hoje.

Por essa razão este piloto procurava fazer tudo da maneira mais correta possível.

Durante o voo não excedia na altura e nem baixava muito.

Estava sempre no “padrão”, como falam os pilotos em sua linguagem.

A foto mostra um helicóptero fazendo looping em Nova York, manobra ainda não realizada por nenhum piloto brasileiro

De minha parte recebi a orientação da Rádio Eldorado, quando fui contratado, para fazer uma linguagem diferenciada.

Em um tempo onde ainda não havia telefones celulares, a ideia era mostrar aos ouvintes que lá em cima havia um amigo.

Mandavam eu entrar no ar como se estivesse falando ao telefone.

“Olha, eu estou aqui em cima observando que a Avenida 23 de Maio está congestionada no sentido do aeroporto, mas se você puder fazer um caminho utilizando a Consolação e a Paulista, vai encontrar tudo livre...”

Quem não gosta de ser elogiado que atire a primeira pedra!

O  trabalho que a Rádio Eldorado levou adiante era o que havia de mais moderno em termos de linguagem no rádio.

A audiência melhorava a cada e as concorrentes passaram a seguir o que estava dando certo.

Por isso o nosso diretor-executivo João Lara Mesquita passou a dizer: 

"Eldorado, pioneira na cobertura do trânsito com helicópteros", para ciúmes de alguns que já haviam feito reportagens aéreas em décadas anteriores sem o mesmo resultado.

Buscando inovar a cada dia, certa vez eu disse durante um boletim algo que me pareceu normal para os ouvintes:

“... Para que sair da Avenida Rebouças e ingressar na Dr. Arnaldo onde estou agora, o comandante Schaffer precisou fazer uma manobra radical...”

Essas palavras ofenderam o comandante que falou comigo depois voo, não de maneira nervosa, mas com preocupação.

“A empresa para a qual trabalho é a representante do R-22 no Brasil, se eles ouviram que você disse que eu fiz uma manobra radical, irão me chamar a atenção”.

Para ele a manobra radical seria entendida como alguma imprudência dele.

Perguntei se ele chegou a ser advertido por algum controlador de voo e ele disse. Não, eu não fiz nada de irregular.

“Então esquece porque eu fiz isso só para tornar a nossa linguagem no rádio mais dinâmica”, ponderei.

Realmente ninguém reclamou e não deu em nada. 

"Neuras de um piloto", pensei comigo.

Este é um integrante da "Família Robinson". O R-44 além de transportar piloto e repórter pode levar mais dois passageiros

Muitos anos se passaram quando em 2002, quem se surpreendeu com uma frase dita no rádio fui eu, por incrível que pareça.

A apresentadora e produtora musical Patrícia Palumbo levava ao ar na Eldorado FM um programa chamado “Hora do Rush”.

Sempre no final de tarde - início de noite - ela levava ao ar música de qualidade entremeada por conversas agradáveis.

Nos intervalos havia as inserções do repórter aéreo com informações do trânsito.

Costumeiramente o titular desse horário nos sobrevoos era o repórter aéreo Jair Rafael, mas naquele dia não me lembro o motivo, precisei substituí-lo.

Decolamos em um Robinson-44 pilotado pelo comandante Marcelo Fagundes, cujo início de carreira tem um história bonita que ainda irei contar.

Havia também dois passageiros a bordo, ouvinte e acompanhante, por causa de uma promoção no programa.

Ao anoitecer a cidade se ilumina e do helicóptero se tem uma visual muito atraente para quem voa como passageiro

Perto do pouso houve uma última entrada e ao encerrar o boletim, assinei meu nome e disse: “A caminho do Campo de Marte”.

Nisso, a Patrícia Palumbo brincou do estúdio: “Geraldo Nunes sonha em fazer um looping de helicóptero! Abraço, Geraldo".

Foi uma brincadeira dela, mas aquilo me deixou preocupado.

"Será que vão pensar que eu peço mesmo para os pilotos fazerem looping? Isso é muito arriscado tenho que reclamar com ela".

Pensei como alguém que mesmo ficando coroa.

Looping para quem não sabe, é uma palavra inglesa que descreve um movimento circular em plano vertical.

Aviões de acrobacias fazem looping no céu, mas com helicópteros eu nunca tinha visto até então.

Pessoa madura e já diferente dos tempos das brincadeiras com o comandante Schaffer, desembarquei irritado.

Depois pensando melhor decidi ficar quieto: "Irão achar que eu estou ficando neurótico".

Realmente ficar calado foi a melhor decisão da minha parte, porque a apresentadora quis também como eu anteriormente, maior proximidade com os ouvintes.

Esta é Patrícia Palumbo, jornalista e apresentadora de rádio muitas vezes premiada

Lembrei desse episódio porque assisti recentemente a um vídeo que me chegou pelo WhatsApp e me deixou impressionado.

Assisti as acrobacias aéreas do piloto norte-americano Chuck Aaron em um helicóptero patrocinado pela Red Bull sobre o Rio Hudson, em Nova York.

Fui pesquisar e descobri que Aaron é o único piloto autorizado realizar manobras desse tipo nas três Américas.

Com mais de 20 mil horas de voo, já realizou mais de 200 shows de acrobacia nos Estados Unidos.

Este é Chuck Aaron piloto que conseguiu convencer a Red Bull a patrocinar suas acrobacias em helicópteros nos EUA

Me lembrei então das “manobras radicais” do comandante Schaffer e do “looping” da Patrícia Palumbo e me pus a escrever para este blog.

O helicóptero utilizado por Chuck Aaron é de fabricação alemã, marca Messerschmitt.

Helicóptero de fabricação alemã é utilizado pelas polícias de vários países e um dos poucos capaz de voar de cabeça pra baixo

Já imaginou alguém voando de ponta-cabeça sobre a cidade de São Paulo?

O risco é grande, operações desse tipo na capital paulista, se autorizadas aconteceriam sobre represas para se evitar riscos.

O vídeo a seguir foi gravado em 2019 sobre o Rio Hudson que separa Manhattan de New Jersey. Vale a pena assistir.



Diante de toda a experiência em voos de helicóptero, ainda assim, se Chuck Aaron me convidasse para acrobacias ao lado dele, não sei se aceitaria.

Os cabelos brancos nos tornam mais prudentes. Eis a questão.

E você toparia voar como passageiro nessas acrobacias?

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