O Monumento do Ipiranga, inaugurado durante as comemorações do centenário da Independência do Brasil, em 1922, tem uma história polêmica que envolve o sempre combativo escritor Monteiro Lobato.
Em 1917, mesmo ano em que o escritor fez um levante nas páginas do Estadão contra os modernistas durante a exposição das pinturas de Anita Malfatti, um edital publicado pelo governo paulista convocou escultores para a participação em um concurso que iria escolher o monumento a ser construído em homenagem aos 100 anos do célebre grito de Dom Pedro I.
Participaram da licitação artistas renomados da Europa e das Américas, como Luigi Brizzollara e Nicola Rollo, entre outros, além de um desconhecido até então para os brasileiros, Ettore Ximenes.
Todas as maquetes desses
projetos foram colocadas em exposição no Palácio das Indústrias e, no último dia
da mostra, anunciou-se a obra vencedora. Coube a vitória ao projeto do
escultor italiano.
Jornais da época
consideraram que a decisão dos jurados não foi a melhor e levantou-se a hipótese de haver por
trás da decisão um jogo de cartas marcadas. Todos acharam que o resultado foi uma tremenda marmelada.
O motivo estava no fato de
um projeto de Ettore Ximenes ter sido derrotado em um concurso semelhante na
Bélgica e sua inscrição no Brasil veio com o propósito premeditado de fazê-lo
ganhar.
De fato, o monumento
possui esculturas que nada têm a ver com a independência, como, por exemplo, um carro de combate romano que se chama Biga, sendo puxado por cavalos na parte mais alta.
Em um livro publicado em
1974 com o título “Ipiranga”, o autor Roney Bacelli apresenta um texto extraído
de um jornal paulistano chamado "O Parafuso", publicado em 30 de março de 1920,
no qual Monteiro Lobato escreve de modo irônico que a obra de Ettore Ximenes foi, de
fato, escolhida por antecedência:
“... num dado momento
cruzou conosco um tipo enfunado, de marca exótica, com o ar petulante dos que
chegam à colônia vêm e vencem. O escultor Ximenes, cochichou-nos um amigo, é o
tal que vai fazer o Monumento da Independência!
O concurso para esse
monumento, aberto em 1917, ia encerrar-se somente em 1920; estranhamos, pois,
que, com tamanha antecipação, já se apontasse na rua o vencedor. Vai fazer,
como? Inquirimos. Não está encerrado o concurso, não se conhecem os projetos,
não houve julgamento: como já pode haver um vencedor?
Ingênuo! Não conheces
ainda São Paulo? Julgas acaso que um certame artístico possa ser regido por um
critério moral diferente do que rege os casos políticos e os concursos para
empregos públicos?
Concorra quem concorrer,
Miguel Ângelo, Rodin ou Jevach, ainda que ressuscitados, o vencedor há de ser
este Ximenes.
Ele ‘acordou cedo’, já
teceu os paus, já organizou a vitória. Outros serão eleitos, mas o
‘reconhecido’ será ele. Verás”.
Foi o que aconteceu, a obra de Ettore Ximenes
foi a vitoriosa.
Fizeram parte da comissão
julgadora do concurso para a escolha do monumento alguns vereadores,
empreiteiros, engenheiros e funcionários públicos. O que acham vocês?
Mesmo quando faltou a
verba oferecida pelo governo e só depois enviada, o escultor não desistiu. Na ocasião, disse que tocaria a obra ainda que fosse com dinheiro do próprio bolso.
Talvez tenha sido exagerado, não foi preciso chegar a tanto, porque o dinheiro saiu.
Ettore Ximenes permaneceu no Brasil até o final das obras do monumento, concluídas em 1926, ano em que ele faleceu na cidade de Roma, no dia 20 de dezembro.
O escultor foi amigo do pintor Pedro Américo e, para homenageá-lo, fez uma reprodução em alto relevo no bronze do famoso quadro da independência, na parte frontal do monumento.
Os anos passaram e a obra de Ettore Ximenez agora é parte da paisagem urbana, abrigando em seu interior os restos mortais de Dom Pedro I e das imperatrizes Leopoldina e Amélia.
Pena que nem todos tenham
tempo de ver o monumento com a devida atenção por causa do trânsito sempre
agitado da metrópole.
O monumento está passando por um processo de limpeza para estar prontinho para as comemorações do 7 de setembro, quando a obra deixada por Ettore Ximenes completará seu centenário de inauguração.
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Ótima matéria, querido Geraldo! Muito oportuna para os duzentos anos da independência!
ResponderExcluirMuito bom, Geraldo, você sempre excelente. Infelizmente as escolas não ensinam a bravura de Lobato. Só falam dele sobre o Sítio do Pica-pau. Uma grande mancada, o foi o caixão do imperador ter 8cm a mais do que o sarcófago. Só faltou, o gal. presidente, mandar colocar na cripta, a bola com que o Jairzinho marcou o gol contra Portugal, pela taça independência. Eduardo Castro Gama no Facebook.
ResponderExcluirPontual, como sempre, abraços
ResponderExcluirExcelente artigo!
ResponderExcluirMuito interessante saber da história do monumento.
ResponderExcluirSerá que Monteiro Lobato reviu seu julgamento? Grato pelas informações históricas, Geraldo.
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