domingo, 29 de maio de 2022

O rádio, as feiras livres e o costume de reclamar

Durante anos apresentei um programa de rádio chamado De Olho na Cidade que abria espaço para as reclamações dos ouvintes. Dessa experiência cheguei à conclusão que o povo gosta e muito de reclamar, tenha motivo ou não.


Os ouvintes reclamavam de tudo e gostávamos porque aumentava a nossa audiência, mas até de questões pessoais que não tínhamos como resolver pintavam na programação. Por exemplo: o vizinho do apartamento ao lado que assiste televisão em volume alto até altas horas e dificulta o sono de quem precisa acordar cedo no dia seguinte.

Coisas assim precisam ser resolvidas entre as partes, mas o reclamante entra em contato com a rádio para não se expor e por achar que através dos microfones ele resolverá a questão.

Assuntos ligados ao sono eram recorrentes entre os ouvintes, mas certa vez um cidadão de um bairro da periferia, entrou no ar pelo telefone e reclamou de um sabiá-laranjeira que piava todas as madrugadas em uma árvore próxima de sua janela, a partir das 3h30 e o acordava cedo demais. 

O que fazer? Os galos também começam a cantar a partir destes horários e até pouco tempo atrás eu mesmo ouvia do meu quarto um galo cantando nas imediações, mas de repente seu canto sumiu. Acredito que o destino dele tenha sido o mesmo de outros da sua espécie, ou seja, alguma panela.

Outra reclamação costumeira pelo rádio era, e ainda é, contra os feirantes que começam a montar suas barracas antes do nascer do sol e fazem barulho, embora exista agora uma legislação a respeito desses horários.

Mas em São Paulo é assim, todos gostam das feiras livres, desde que aconteçam fora da rua onde moram.

Sabe-se que as feiras ocupam o espaço público, impedem o trânsito e interditam as garagens, mas a vantagem de tê-las por perto também é grande, por causa das frutas e verduras sempre fresquinhas.

As feiras livres fazem parte do cotidiano da cidade, desde o século 18. Contam os historiadores que chacareiros provenientes da Penha, do Tatuapé, de Pinheiros e do Ó, levavam até o centro os seus produtos para serem vendidos.

Os feirantes daquele tempo se utilizavam somente de um tabuleiro sem cobertura que ficava exposto ao sol e à chuva.

Geralmente não era o dono da chácara quem vendia os produtos, mas sim um escravo idoso que já não produzia bem na lavoura.

Esse trazia consigo algum outro ajudante que perdera parte da visão, ou que por algum motivo ficou aleijado.

A mulher escrava doente também se tornava feirante, só que os lucros iam todos somente para o chacareiro.

As feiras livres do século 18 tinham outro nome; “quitanda”, por isso existe até hoje a Rua da Quitanda, no centro velho.

O Largo do Café também leva esse nome por causa da comercialização deste produto naquele ponto. Por causa das feiras, é que surgiram na Pauliceia as ruas de comércio especializado.

Desde os tempos de Piratininga, os feirantes apregoam seus produtos fazendo algazarra para alegrar o ambiente.

As feiras livres como conhecemos hoje foram institucionalizadas na cidade de São Paulo em 1914, por decisão do prefeito Washington Luiz Pereira de Souza. A iniciativa se deu para oficializar algo que já ocorria informalmente, como explicamos, desde os primórdios.

A primeira feira livre nos moldes estabelecidos pela prefeitura contou com a presença de 26 feirantes e teve lugar no Largo General Osório e a segunda realizou-se no Largo do Arouche, com 116 feirantes. Houve depois a terceira, no Largo Morais de Barros.

Na atualidade, acontecem 922 feiras livres todas as semanas na capital paulista entre as terças e domingos, no horário entre 7h30 e 13horas. como manda a legislação.

A história paulista e das feiras livres caminham juntas, embora todos saibam que feira livre boa, é aquela que acontece na rua dos outros.




3 comentários:

  1. Amigo Geraldo: quando se está no Exterior, como agora que estamos em Ashburn Village, na Virgínia, EUA, é que se importância... mais importância do que normalmente. Abraços. Até a volta.

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  2. Pura verdade. Feira é muito bom, mas na rua do outro, kKKK. Eu adoro feira. Era meu passeio de sexta feira com minha mãe, quando criança, comer frutas e pastel. Delícia. Boas recordações.

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  3. Geraldo, como faço para saber o endereço de feiras livres nas imediações da minha casa em cada dia da semana ?

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