segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Já assisti a muitas enchentes em SP e numa delas precisei almoçar pão com fígado para não desmaiar de fome

O temporal verificado em São Paulo nesta segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020, foi o maior em volume dos últimos 37 anos, informa o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).

Em 21 anos de sobrevoos entre 1989 e 2010, como repórter aéreo assisti a inúmeras enchentes, com seus estragos, prejuízos, congestionamentos de trânsito intermináveis e até mortes.

Mas vendo as fotos que resultaram dessa última chuva percebo que nas marginais o transbordamento dos rios Tietê e Pinheiros pode mesmo ter sido acima do registrado em outras ocasiões.


Esta foto aérea da Ponte da Casa Verde mostra que água ocupou as três pistas dificultando até mesmo a entrada na alça de acesso.



Nesse outro registro, também da Ponte da Casa Verde, o fotógrafo puxou a imagem do local onde estava pelo zoom e se vê um carro submerso.

A recomendação dos Bombeiros e da Defesa Civil passou a ser: Evitem sair de casa. Pura verdade. Fazer o que fora do ninho, numa ocasião dessas?


A Ceagesp também foi invadida pelas águas, imagine o tamanho do prejuízo com a quantidade de alimentos perdidos e outras mercadorias, fora o estrago de quem teve seu veículo ocupado pela enchente.


Na Marginal do Pinheiros na altura da Ponte Cidade Jardim, só passavam os mais corajosos, porém o risco de se perder o carro e até a vida em uma enchente é bem grande.


O Campo de Marte costumeiramente fica alagado em dias de enchente. Lá enfrentei situações difíceis.

Certa vez começou a chover forte logo ao amanhecer, mesmo assim o motorista Adão de Souza conseguiu chegar me transportando no carro de reportagem até o Hangar Fontoura onde ficava guardado o helicóptero da Rádio Eldorado.

O comandante Costandi Kardosh já havia posicionado a aeronave, na ocasião um Enstrom 280 FX, sobre uma plataforma onde a enchente não chegava, abastecido e pronto para voar.

Ocorre que em minha volta estava tudo inundado e como sou paraplégico, não tinha jeito de sair do carro e ir até a aeronave caminhando sem molhar as minhas botas ortopédicas.

Alguém então teve a ideia de me colocar em um carrinho utilizado para carregar peças.

Me deitaram no carrinho puxado a mão e me levaram até o helicóptero, deitado como fazem com os jogadores que se machucam durante as partidas de futebol.

Lá em cima da plataforma me tiraram do carrinho e pude embarcar no helicóptero onde voamos durante duas horas.

Ao retornar reabasteceram a aeronave e voltei a voar por mais duas horas e assim por diante até as duas da tarde, falando do trânsito.

Após um terceiro sobrevoo, eu já não aguentava mais de fome e comecei a sentir tonturas.

Foi quando o Getúlio, um gentil funcionário do Hangar Fontoura, me ofereceu o lanche que ele havia trazido. "Eu já almocei", explicou.

"Pão com fígado", ele me disse. O quê? Eu tinha aversão por fígado, mas ou era aquilo ou iria desmaiar de tanta fome. Agradecido, aceitei.

Trêmulo, devorei o lanche seguido de um copo d'água. Foi o melhor pão com fígado que já comi na minha vida.

Alimentado continuei sobrevoando até as 4 da tarde quando então as águas da enchente começaram a baixar.


Bife de fígado acebolado com pão, uma delícia!

Repórter aéreo mais sofre que se diverte.


Fotos: Portal G1

4 comentários:

  1. Geraldo: é preciso ter muito "figado" para enfrentar uma cobertura dum dia como esse 10 de Fevereiro de 2020.

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  2. Oi Geraldo, pela sua definição, hoje São Paulo está inundada, não alagada. Está um caos. Mais uma vez, legal sua contribuição. Engrandece o nosso conhecimento.

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  3. Quando quiserem desconvidar você é só dizer que o prato principal será pão com fígado kkk

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