“São Paulo cresce e se modifica a uma velocidade tão grande
que, de uma geração a outra, os jovens já não mais conhecem a cidade onde
viveram seus antepassados recentes.”
A frase acima está no livro São Paulo, Três Cidades em um Século, do saudoso professor da FAU/USP, Benedito Lima de Toledo, sobre as mudanças ocorridas na capital paulista do século 20.
Para confirmar o que a frase diz vamos iniciar uma série de
postagens sobre a verticalização de São Paulo ao longo dos anos.
Uma estimativa aponta que na capital paulista estão de pé,
cerca de 30 mil edifícios acima dos 20 metros de altura, nem mesmo a prefeitura,
entretanto, possui o número exato.
Nossa Pauliceia passou a ganhar ares de metrópole pelo início do século 20, com a inauguração em 1913 do Edifício Guinle de 7 andares, na Rua Direita 49, que aparece na foto acima.
Considerado o primeiro prédio vertical construído no Brasil,
seu projeto original, desenvolvido pelo arquiteto Hyppolito Gustavo Pujol
Júnior, previa a construção de apenas 3 andares.
Os donos da empresa “Guinle & Cia”, entretanto, mandaram
erguer durante a obra, mais 4 pavimentos.
O termo “arranha-céu” surgiu nos Estados Unidos com o nome
“skycraper”, para designar as construções com pelo menos 10 andares erguidas em
grandes cidades como Chicago, Nova York e Detroit, pelo final do século 19.
Com base na projeção norte-americana, o Edifício Sampaio Moreira, inaugurado em 1924, passou a ser considerado marco inicial da verticalização de São Paulo.
Suas características são de um “arranha-céu”, possui altura de 50 metros e 12 andares.
Tombado pelo Patrimônio Histórico em 1992, o Sampaio
Moreira foi desapropriado pela prefeitura e a Secretaria Municipal de Cultura
ocupa suas dependências.
A Casa Godinho, tradicional mercearia fundada em 1888, ocupa
o espaço da loja térrea do Sampaio Moreira desde 1924, mesmo ano da inauguração
deste prédio da Rua Líbero Badaró, 340.
O reinado do Sampaio Moreira como edificação mais alta da
cidade, durou apenas cinco anos.
Veio depois o Edifício Martinelli com 28 andares e 106
metros de altura que tomou o seu lugar em 1929.
Quem mandou construir o "arranha-céu" foi Giuseppe Martinelli, um italiano nascido em Lucca, na região Toscana.
Ele chegou ao Brasil em 1893, primeiro trabalhou como açougueiro, depois foi trabalhar numa companhia de despachos aduaneiros em Santos, prosperou na vida e se tornou empresário.
A partir daí seu grande sonho passou a ser deixar uma
marca que perpetuasse o seu nome na história da cidade.
Para levar adiante sua meta, comprou as áreas vizinhas e o
terreno onde funcionava o requintado Café Brandão, ponto de encontro dos
políticos e homens de negócios da São Paulo do início do século 20.
O quarteirão entre a Rua São Bento, Rua Líbero Badaró e a
Ladeira de São João era o ponto mais valorizado de São Paulo.
Um imprevisto aconteceu, ao iniciar as obras surgiram
problemas, minava água nas fundações e para resolver a questão foi preciso
gastar muito dinheiro.
Martinelli não teve dúvida, viajou para a Itália e foi
pedir ajuda ao ditador Benito Mussolini.
O mais surpreendente é que o “Duce” atendeu, liberou verbas acima do pedido, com a condição de que o edifício tivesse o dobro da altura prevista, em torno dos 50 metros.
Mussolini exigiu que fosse o mais alto “arranha-céu” da América Latina para assim, projetar o nome da Itália aos olhos do mundo inteiro.
Martinelli não teve mais dúvidas e nem dívidas, dobrou o
tamanho da construção para 106 metros e o povo incrédulo, passou a dizer que a
construção onde antes minava água, não se sustentaria muito tempo de pé, o
prédio iria desabar em pouco tempo.
Em 1929 tudo ficou pronto e foi inaugurado com 28 andares, além da cobertura que serviu de residência para o empresário e sua família.
Ele achava que com isso, representantes da alta sociedade
paulistana se mudariam para o edifício, o que não aconteceu.
Depois da inauguração, o gigante “arranha-céu” continuou longo tempo vazio, o preço dos apartamentos era altíssimo, ninguém se interessava em comprar e o primeiro morador foi Arturo Patrizi, um professor de dança.
Além de morar, Patrizi montou nos primeiros andares sua
escola, ganhou muito dinheiro e ficou famoso com ela.
Com o passar do tempo, entretanto, o prédio perdeu o
glamour, e os apartamentos começaram a ser alugados para famílias de baixa renda.
Crimes aconteceram nas dependências e até a fama de ser
mal-assombrado, o edifício recebeu.
Em 1975, o então prefeito Olavo Setúbal desapropriou o Martinelli
e sua restauração deu novos ares ao lugar.
Recentemente visitas educativas ao topo do Edifício
Martinelli passaram a ser realizadas mediante agendamento prévio.
O passeio dura cerca de uma hora, guias especializados dão explicações históricas
relativas ao prédio e ao centro paulistano.
Além disso, a residência da cobertura pode ser alugada para eventos e o sonho de Giuseppe Martinelli, de ter o seu nome perpetuado, ocorreu.
Fontes: Gazeta de São Paulo: Edifício
Martinelli: 100 anos de história, cultura e revitalização em São Paulo - Gazeta
de São Paulo (gazetasp.com.br)
Edifício Martinelli: Edifício
Martinelli – Arquitetura Italiana (usp.br)
Livro: TOLEDO, Benedito Lima de. São Paulo,
três cidades em um século. São Paulo: Cosac & Naify/ Livraria Duas Cidades/
Acesso em: 28 jul. 2024
Fotos: Gazeta de São Paulo – Catraca Livre -
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