segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Vovó do Pito, primeira torcedora símbolo do Palmeiras, teve sua história resgatada por Thais Matarazzo

Tive a honra de conhecer em vida o poeta Paulo Bomfim e desfrutar de sua amizade.

O mesmo aconteceu com Thais Matarazzo, jornalista, escritora e editora de livros que partiu desta vida há um ano, em 11 de janeiro de 2023.

Thais, durante uma conversa informal, ouviu do poeta um relato interessantíssimo sobre a Vovó do Pito, antiga escravizada que ele conheceu quando menino e que viveu 110 anos.

Adelaide Antônia das Dores era o nome verdadeiro da vovó que nasceu em uma senzala de Sorocaba, em 10 de dezembro de 1823, um ano depois da Independência do Brasil.

Casou-se jovem, teve dois filhos que morreram na infância e seu marido, enviado à Guerra do Paraguai, lá morreu.

Ela soube da notícia alguns anos depois quando dois de seus irmãos, que também lutaram na guerra, regressaram a Sorocaba como heróis e ganharam suas cartas de alforria.

“Siá Adelaide”, como era chamada, recebeu a liberdade pela morte do marido, arrumou seus pertences e se mudou para a capital em uma viagem feita sobre o lombo de uma mula, junto a um grupo de tropeiros.

Trabalhou como cozinheira e quituteira, passou por diversas residências abastadas e deixou boas impressões por suas qualidades e sentimentos afetuosos.

Era costume no passado, entre as mulheres da roça, usar um pito carregado de fumo aceso para lançar fumaça e assim espantar os mosquitos. Deste hábito surgiu o apelido.

Sua vestimenta se constituía de uma saia longa e florida, chapéu de palha de aba larga, sacolinha de pano e um terço pendurado na cintura.

Após ouvir os relatos do poeta, Thais Matarazzo saiu em busca de mais informações para assim resgatar e perpetuar as memórias dessa antiga personagem paulistana.

De sua pesquisa surgiu o livro “Vovó do Pito e o Menino Paulo”, escrito por Thais Matarazzo e lançado por sua editora em 2021.

Nascido em 1926, Paulo Bomfim conheceu a Vovó do Pito antes ainda de completar 7 anos de idade.

Disse tê-la visto circulando pelas ruas movimentadas do centro e de ouvir suas histórias afetuosas, narradas pelos pais e familiares.

Contavam que a vovó gostava de visitar as redações dos jornais, era bem-recebida pelos repórteres que em sua homenagem todos os anos noticiavam seu aniversário.

A idade avançada chamava a atenção dos leitores e tudo isso fez dela uma pessoa conhecida na cidade toda.

Thais reporta tudo isso no formato de um conto e insere o poeta ainda menino no conjunto da história.

Vovó gostava de futebol, era torcedora fanática do Palestra Itália, participou de caravanas, foi chefe de torcida e não perdia um jogo sequer no campo da Água Branca.

Conta-se que certa vez ao achar que o juiz estava sendo desonesto com o seu time, entrou em campo e discutiu com ele.

Eram outros tempos, contida pelo presidente do clube, Dante Delmanto, o árbitro relevou a conversa, pois já conhecia a boa velhinha e tudo terminou em paz.

Se o caso realmente aconteceu, a torcida com certeza foi ao delírio! Imaginem cena semelhante nos dias atuais?

Por este motivo, a Vovó do Pito é classificada por alguns historiadores do Palmeiras, como a primeira torcedora símbolo do clube.

Graças à Vovó do Pito pude rever pela última vez, em outubro de 2022, a escritora e amiga Thais Matarazzo.

Foi no relançamento de seu livro durante um sarau na Biblioteca Municipal Raul Bopp, no Parque da Aclimação.

Na oportunidade foi apresentada a pintura original do artista belga Adrien Henri Vital van Emelen (1868-1943) que, recém-chegado ao Brasil, retratou Adelaide em sua tela “Negra com chapéu e cachimbo”, bem como “Negra rezando com terço”, também aqui inserida.

A vovó faleceu em 21 de novembro de 1934, com 110 anos de idade, o menino Paulo nos deixou em 2019, aos 92 e Thais quando tinha apenas 40, foi se unir a eles. Essas questões de longevidade, ou não, somente Deus consegue explicar, melhor a nós é não comentar, deixar nas mãos dele.

Na foto tirada em novembro de 2016 participo com Thais Matarazzo em uma tarde de autógrafos, do lançamento de algumas das coletâneas de sua editora, no Shopping Frei Caneca. 

Agora como blogueiro, minha missão continua sendo a de contar histórias que envolvem as personagens paulistanas de todos os tempos, como é o caso agora de Thais Matarazzo, especialmente em um momento igual a este, às vésperas de mais um aniversário dessa Pauliceia cada dia mais Desvairada.

Para provar que a Vovó do Pito realmente existiu, há o filme documentário “São Paulo, a Sinfonia da Metrópole” de 1929, disponível no Youtube, onde ela aparece aos 59 minutos, quase no final da projeção. Acesse:

No filme está a vovó a caminhar pela Av. São João com o auxílio de uma bengala. Vale a pena ver o filme na íntegra. Há uma remontagem da Proclamação da Independência que ficou lindíssima.

 

Créditos: Fotos Vovó do Palestra e do Parque Antártica na década de 1920 pertencem ao Acervo Histórico/Palmeiras. As duas fotografias com Thais Matarazzo fazem parte do meu acervo pessoal e foram feitas por Gustavo Alves. Demais imagens são reproduções retiradas do Google 


4 comentários:

  1. Interessante.
    Muito interessante, Amigo Geraldo Nunes. Mensagem de Cláudio Amaral, via WhatsApp

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  2. Caro amigo nobre Geraldinho engenheiro da comunicação/ jornalismo, o seu mais novo texto do seu Blog reafirma o seu profissionalismo, confirma mais uma vez a sua experiência e maturidade no trato de um assunto do passado que premia um ser humano querido como a dona Adelaide Antônia das Dores, conhecida como Vovó do Pito 😁

    Seu texto é um reconhecimento, um elogio para as fontes que premiam os leitores com produções primorosas; evidentemente que vc merece os parabéns, uma atitude minha ou dos leitores motiva e inspira você a continuar com seu trabalho minucioso.
    É importante sim ressaltar suas qualidades, parabenizá-lo pelos resultados proporcionados pelas suas reportagens, pesquisas e observações. Ficamos satisfeitos e orgulhosos dos nossos trabalhos bem executados 👍Afonso José de Souza, via WhatsApp

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  3. Que história....Sensacional

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