quinta-feira, 8 de outubro de 2020

A eleição de 1982, as Diretas Já e o Brasil de hoje

Convido as pessoas que estão acompanhando esta série de textos em meu blog sobre as eleições no Brasil, para que reflitam comigo neste último capítulo.

Inegável que durante o regime militar (1964-1985) houve desenvolvimento e crescimento econômico. Um exemplo é a reformulação do ensino superior que permitiu o acesso de mais pessoas às universidades. Além disso obras importantes como a Ponte Rio-Niterói e a Usina Hidrelétrica de Itaipu, foram realizadas com sucesso.

Por outro lado, eram tempos agitados de enfrentamento parte a parte, entre governo e grupos armados contrários ao regime. A consequência foi um número elevado de mortes em ambos os lados e ainda, prisões e exílio para milhares de brasileiros, além de repressão e torturas.

Foi um passado difícil e que felizmente ficou para trás. Neste caso a melhor coisa é não ser saudosista. 

Viver em uma democracia também é complicado, mas tenha certeza de uma coisa; estamos em uma situação melhor que nos "anos de chumbo", graças ao direito da liberdade de expressão. Nos tempos do regime militar, um texto simples e didático igual a este seria censurado, com toda a certeza.

Neste aspecto peço a atenção de todos. O importante é pensar no futuro. O que planejar para o Brasil até 2030 ou 2040?

Tentar repetir o passado é retrocesso, até porque, "nada será como antes, amanhã", diz uma canção na voz de Milton Nascimento.



O mundo atual em nada se assemelha ao que tínhamos entre as décadas de 1960-1970, por exemplo, vivíamos a guerra fria entre americanos e soviéticos e os Estados Unidos precisava da América Latina a seu lado, hoje as preocupações norte-americanas são outras.

Nossa série sobre as eleições foi preparada para coincidir com o início das campanhas eleitorais para a escolha dos novos prefeitos em todo o país. O voto direto e secreto legitima a nossa constituição e por conseguinte a nossa democracia.

A intervenção militar no Brasil, em 1964, livrou o país de uma situação insustentável diante de um governo fraco e indeciso, mas aos poucos foi se transformando em uma ditadura, por suprimir direitos, entre os quais o voto direto.

As eleições presidenciais que aconteceriam em 1965 foram canceladas. Depois os partidos políticos existentes acabaram extintos. 

Duas siglas foram criadas para abrigar situação e oposição: Aliança Renovadora Nacional - Arena e Movimento Democrático Brasileiro - MDB, respectivamente.

A constituição de 1946 foi substituída por outro texto promulgado em 1967, mantendo de fora as eleições presidenciais, de governadores dos Estados e de prefeitos das capitais, além dos municípios considerados de segurança nacional: Santos, Cubatão e Paulínia.

O voto direto foi substituído por um Colégio Eleitoral formado por congressistas, eleitos pelo povo, que por sua vez passaram a eleger os presidentes que o governo indicava, sempre generais.

Nas assembleias legislativas, os deputados estaduais votavam para a escolha dos governadores. Sempre havia um nome indicado pelo presidente da República para cada Estado e era este o vencedor. Cabia depois ao governador eleito pelos deputados, escolher o prefeito de sua capital.



Assinado em uma sexta-feira 13, no mês de dezembro de 1968, o Ato Institucional n°5, impôs a repressão para qualquer tipo de manifestação em praças públicas ou recintos fechados e determinou a censura nos meios de comunicação, incluindo não só os jornais e revistas, mas também as rádios, as TVs, cinemas e teatros.

O AI-5 veio em um momento de conturbação política causado por manifestações estudantis de rua e ações consideradas subversivas. Cerca de 1.400 pessoas foram presas, cassadas politicamente que passaram na maioria a viver no exílio.

Nem todos os cassados tinham engajamento nos movimentos de esquerda. Faziam sim, oposição ao governo, mas os militares costumam confundir adversários com inimigos e o ponto de vista dos que comandavam o governo prevaleceu.

O AI-5 vigorou durante 10 anos, foi extinto em dezembro de 1978, no governo do presidente Ernesto Geisel, após pressões da sociedade civil com o apoio de uma parte do Congresso Nacional ligada ao MDB.

Fazia parte dessa ala do Congresso, o deputado federal Ulysses Guimarães, além dos senadores Franco Montoro, Tancredo Neves e outros líderes de oposição.

O presidente da República, Ernesto Geisel, em 1° de abril de 1977, fazendo uso de suas prerrogativas constitucionais, fechou o Congresso Nacional.

Durante os 14 dias em que Senado e Câmara paralisaram seus trabalhos, o governo elaborou uma série de medidas para garantir maioria no Poder Legislativo, em especial no Senado.

Entre as medidas do Pacote de Abril, estava a eleição indireta para um terço dos senadores, que seriam indicados pelas respectivas assembleias estaduais.

Mesmo sob censura, a imprensa e a população apelidaram os novos parlamentares de "senadores biônicos".  Assim, no ano seguinte, 23 não eleitos pelo povo tomaram posse. A Arena ganhou 15 cadeiras e o MDB 8.

Com os "biônicos", os votos favoráveis ao governo passaram para 38 contra 8, uma vitória esmagadora.

Assim mesmo, o regime seguia pressionado cada vez mais pela opinião pública, levando o presidente da República a dar início a uma abertura política lenta, gradual e segura. 

Ernesto Geisel manteve o processo nas mãos, em outubro de 1977, ele afastou as pretensões sucessórias de seu ministro do Exército, o general Sylvio Frota, integrante de uma ala do exército contrária à abertura.

Frota foi demitido sumariamente, ficando aberto o caminho para a volta da normalidade institucional ao país.

A Lei Falcão, batizada com o nome de seu autor, o então ministro da Justiça, Armando Falcão, proibia o debate nas campanhas eleitorais ao legislativo pela TV e no Rádio. Eram apenas exibidos os "santinhos" com o respectivo nome e número. 

Esta lei foi extinta para que as eleições diretas para a escolha de governadores, no ano de 1982, acontecessem da forma mais democrática possível. A decisão permitiu a volta dos debates entre os candidatos.

A abertura política também permitiu a implantação de uma anistia ampla, geral e irrestrita, garantindo assim a volta dos exilados políticos ao Brasil.

O vitorioso do pleito histórico de 1982, no Estado de São Paulo, foi o senador André Franco Montoro, do MDB, eleito com mais de 5 milhões de votos.



Com o pluripartidarismo restabelecido, Montoro teve como adversários na eleição; Reynaldo de Barros (PDS), Jânio Quadros (PTB), Luiz Inácio Lula de Silva (PT) e Rogê Ferreira (PDT).

Logo após sua posse, em uma edição do programa de televisão Canal Livre, da Rede Bandeirantes, o senador alagoano Teotônio Vilela, defendeu a organização de uma série de comícios pelo País, pedindo a volta das eleições diretas para presidente da República.  

A sugestão foi abraçada pelo governador Franco Montoro que organizou o primeiro comício para que as eleições presidenciais se tornassem realidade.

Tramitava no Congresso uma proposta de emenda constitucional apresentada pelo deputado federal, Dante de Oliveira (MDB-MS), restabelecendo as eleições para presidente da República, em 15 janeiro de 1985.

O primeiro comício por eleições diretas para presidente se deu um ano antes, na Praça da Sé, em 25 de janeiro de 1984.

Na data de aniversário dos 430 anos de fundação da cidade de São Paulo, compareceram ao marco zero mais de 250 mil pessoas reivindicando ao lado de políticos e artistas, a volta das eleições presidenciais.

O movimento ganhou o nome Diretas Já e o maior de todos os comícios aconteceu também em São Paulo, em 26 de abril de 1984, no Vale do Anhangabaú, reunindo mais de 1,5 milhão de pessoas.



Ao todo foram 32 comícios Brasil afora, pela aprovação da emenda Dante de Oliveira. Mesmo assim a matéria foi rejeitada em sessão conjunta da Câmara e do Senado, em 25 de abril de 1984.

Embora derrotado na votação, o movimento das Diretas Já saiu vencedor em seus ideais, pelo fato da maioria do Colégio Eleitoral ter votado em Tancredo Neves, para fazer dele o primeiro presidente civil eleito no Brasil depois de 1964.

A posse de Tancredo Neves aconteceria em 15 de março de 1985, mas por problemas de saúde, na véspera da posse, precisou ser internado e a faixa presidencial foi entregue ao vice-presidente, José Sarney.

O presidente João Batista Figueiredo se negou a entregar a faixa para Sarney por achar a medida inconstitucional. Mesmo assim aceitou devolver o poder aos civis de maneira pacífica.

Terminava o regime militar sem nenhum tiro, graças a Deus.



A morte do sucessor eleito aconteceu, em 21 de abril de 1985, no Instituto do Coração, em São Paulo, após 7 cirurgias por complicações múltiplas no aparelho digestivo.

Durante o governo Sarney foi convocada uma Assembleia Nacional Constituinte que redigiu a atual Carta Magna, promulgada em 5 de outubro de 1988, a chamada Constituição Cidadã.

Esta mesma constituição assegurou, em 28 de outubro 2018, a vitória nas eleições e a posse de Jair Bolsonaro como presidente da República, através do voto da maioria da população.

Agora se faz importante defender a continuidade da atual Constituição para assegurar a continuidade da democracia no Brasil conquistada a duras penas. Faço parte da população que foi às ruas pedindo Diretas Já e considero inadmissível qualquer tipo de retrocesso.

Como disse certa vez Winston Churchil, "a democracia é o pior dos regimes, mas não há nenhum sistema de governo melhor."

Neste ano de 2020 teremos eleições municipais. Que se façam essas eleições e outras mais que virão.

Se faz necessário legitimar cada vez mais a nossa constituição que assegura o direito ao voto para o exercício pleno de nossa cidadania. 




4 comentários:

  1. Como sempre amigo Geraldo Nunes, uma colocação clara e elucidadora sobre os fatos.

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  2. Bela síntese de mais um episódio da nossa história.

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  3. Muito bem, Geraldo.
    O voto livre é importante conquista da cidadania. Que seja bem exercido.

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